Seja Bem-Vindo!

PÁGINA INICIAL (Home)

Dica: Utilize a pesquisa personalizada do blog para assuntos específicos em relação ao ceratocone.

Este blog tem o compromisso de divulgar informações precisas e atualizadas sobre o ceratocone e as opções de tratamento, cirurgias e especialmente da reabilitação visual com uso de óculos ou lentes de contato.

Pesquisar este blog

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

ATUALIZAÇÕES SOBRE CERATOCONE 2021

Fig.01: Ceratocone

UMA BREVE INTRODUÇÃO

Faz algum tempo desde a última vez que fiz uma postagem no blog. Após participar de duas excelentes palestras online no mês de Setembro sobre ceratocone, uma por cirurgiões e outra de especialistas em lentes de contato, me inspirei novamente a passar mais informações.

A primeira, ás 18hs do dia 22/09/2021 foi da Pan-American association of Ophthalmology com o título "Abordagem Atual do Ceratocone" com o grande amigo e excelente especialista Dr. Hamílton Moreira, de Curitiba, PR. A palestra foi assistida no Brasil, em Portugal e em diversos países de língua espanhola.

A segunda foi ás 20:30 do mesmo dia, da Sociedade Brasileira de Lentes de Contato, Córnea e Refratometria com o título "Tratamento do Ceratocone Por Adaptação de Lentes de Contato Corneanas" com a apresentação da querida Dra. Luciane Moreira, também de Curitiba, e a participação dos oftalmologistas Dr. Ari de Souza Pena, Dra. Lívia Adnet, Dra. Regina Noma e Dr. Roberto Deway.

Ambas palestras e discussões foram ricas em conteúdo e ratificam de forma contudente que a oftalmologia brasileira não deve nada em comparação ao que está disponível no primeiro mundo. Seguem algumas observações minhas sobre elas. 

Fig.02: Joseph W. Soper
Comecei a estudar o ceratocone bem cedo, em virtude de minha missão de colaborar com meu pai, Dr. Saul Bastos, oftalmologista pioneiro na reabilitação visual com lentes de contato especiais no Brasil. A minha missão começou aos 18 para 19 anos, quando decidi abrir mão de projetos pessoais para ajudar meu pai no desenvolvimento e fabricação de lentes de contato. Meu pai não queria que eu seguisse a medicina, ele via um outro futuro e queria muito que fosse economista. Ao abrir mão deste caminho, ele me disse que se eu queria ajudá-lo teria que estudar muito. Me deu um livro de lentes de contato escrito pelo nosso mestre Jospeph W. Soper (fig.02) e Dr. Louis Girard, escrito na década de 70 e que foi, e ainda é, uma das melhores obras científicas sobre lentes de contato especiais. Me instruiu a ler o livro inteiro. Embora fosse em ingles, eu já dominava o idioma há bastante tempo e na medida que avançava os capítulos eu ia aprendendo os termos mais técnicos e científicos. Li o livro em pouco menos de um mês, ele me orientou a ler novamente. Desta vez li ele inteiro em cerca de 10 dias foi a partir deste momento que começamos a conversar e também a ter aulas práticas, vendo pacientes e observando o que cada porção e modificação no desenho das lentes produzia no resultado final, nos olhos dos pacientes. E assim foi por longos anos, participando de congressos e desenvolvendo e fabricando lentes cada vez melhores.

Fig.03: Dr. Perry Rosenthal
Meu pai abriu as portas para que eu também estudasse com alguns dos maiores especialistas internacionais nas áreas de lentes rígidas especiais, como Joseph W. Soper (TX-US) para lentes rígidas, Perry Rosenthal, MD, PhD (MA-US) que foi professor de meu pai em Boston (fig.03) e Ken Pullum (UK), estes para as lentes esclerais. 

No meio do caminho impossível citar os inúmeros congressos de oftalmologia no Brasil e nos EUA, amigos oftalmologistas de meu pai, os quais tive a alegria de ter como amigos, além dos demais que fui conhecendo ao longo dos anos. Alguns deles, expoentes da oftalmologia na área cirúrgica, seja na cirurgia refrativa, implante de anel, transplante de córnea, catarata e crosslinking, com os quais pude aprender muito sobre córnea e mais especificamente sobre ceratocone, cirurgias  e demais tratamentos.

Na oftalmologia, em relação ao ceratocone há duas linhas de conduta que não necessariamente são contraditórias, embora sejam na essência, mas que acabam em algum momento se encontrando e pelo bem maior que é o de ajudar ao paciente com ceratocone e outras ectasias corneanas a ter uma melhor visão e consequentmente melhor qualidade de vida. A reabilitação visual é fundamental para o paciente manter a sua dignidade, poder levar adiante sua trajetória de vida, seja educacional, profissional, esportiva ou social.

Basicamente, uma linha de atuação acredita no remodelamento da córnea, trata e procura moldar a córnea, ou alterar a sua refração e a outra procura corrigir a visão com o uso de lentes de contato especiais. O objetivo individual de cada procedimento é o mesmo mas seguindo caminhos diferentes. E nesta postagem comento sobre cada uma delas, embora já tenha feito isso em outras postagens antigas, sobre estas linhas e suas peculiaridades, semelhanças e diferenças.

TRATAMENTOS PARA O CERATOCONE


A avaliação do Ceratocone


Em casos iniciais o diagnóstico do ceratocone é mais complexa e exige uma maior experiência do especialista e observação. Os topógrafos ajudam mas também pode ser difícil avaliar os estagios bem iniciais. A topografia foi, desde meados do século 21, o exame que mais ajudou para a avaliação da topografia anterior da córnea e ainda é bastante utilizada. 

Fig.04: Mapa Pentacam

Um avanço na avaliação do ceratocone surgiu com o desenvovimento de equipamentos mais sofusticados como os tomógrafos de segmento anterior, como o Orbscan II e posteriormente o Pentacam, entre outros tomógrafos. No IOSB temos utilizado largamente o Pentacam (fig.04) com seus diferentes mapas e o Tomógrafo de Coerência Óptica (OCT) para a avaliação e planejamento da adaptação de lentes esclerais. 

A paquimetria ultrassônica é considerada o padrão ouro para medir a espessura corneana, no entanto na última dácada a crescente popularização de exames de tomografia de segmento anterior baseados no Scheimpflug como o Pentacam (fig.01), Galilei e TMS-5 tem ajudado muito na compreensão não somente da espessura total da córnea como das demais estruturas e uma série de informações pertinentes que ajudam a compreender melhor a estrutura da córnea.

A biomiscroscopia especular é importante para se ter um controle da contagem e da morfologia das células endoteliais, especialmente dos pacientes usuários de lentes de contato, especialmente de lentes esclerais. Em nossa experiência clínica no IOSB não temos observado alterações significativas em usuários de lentes esclerais. Com uma casuística de pacientes considerável, 51 anos adaptando lentes especiais rígidas e 14 anos adaptando as modernas lentes esclerais permeáveis ao oxiênio, não observamos alterações significativas da contagem de células endoteliais, levando-se em conta que temos um padrão de excelência tanto no desenho das lentes quanto da técnica de adaptação, importante sempre ressaltar.

Embora existam atualmente novas tecnologias como o Ocular Response Analyser (ORA) que é uma tecnologia muito interessante que mede a resistência biomecânica da córnea, ainda são poucos os resultados efetivos dos dados que as mesmas geram. Na verdade elas "quantificam" e "qualificam" o que já é conhecido por exemplo, no ceratocone e demais ectasias corneanas há uma menor resistência biomecânica da córnea. O exame não demonstra a causa mas comprova que há um enfraquecimento das estruturas de colágeno corneano.

Irei mencionar tratamentos que consolidaram-se ao longo dos anos e estão disponíveis e também alguns que foram objeto de estudo mas que não apresentaram a resposta esperada ou ainda encontram-se em estudo.Depois falarei sobre cada um deles.

Tratamentos Consolidados: 

  • Prescrição de Óculos
  • Adaptação de Lentes de Contato Especiais
  • Transplante de Córnea
  • Implante de Anel Intracorneano
  • Crosslinking
  • Cirurgia a laser topoguiada
Tratamentos em Estudo ou e não consolidados:
  • Radiofrequência
  • Keraflex
  • Implante Estenopeico

Tratamentos Consolidados

Prescrição de Óculos

Dentre os tratamentos consolidados temos diferentes opções de acordo com cada caso ou do estágio do ceratocone. No entanto, não é incomum um paciente ter opiniões diferentes de diferentes especialistas no sentido de qual tratamento optar. O que geralmente se observa é que se o especialista tem uma maior experiência em uma determinada técnica muitas vezes aquela técnica será proposta ou indicada ao paciente. Alguns cirurgioes tem experiência com diferentes técnicas e conforme for sua curva de experiência poderá ter uma melhor verstatilidade para determinar o melhor curso a seguir ou até mesmo propor tratamentos combinados, o chamado Protocolo de Atenas.

Nos casos iniciais ou naqueles que felizmente não progridem de forma mais agressiva a prescrição de óculos é viável e bastante utilizada. No entanto é importante que a refração seja muito bem elaborada pelo oftalmologista. Alguns ao constatar o ceratocone já desistem de realizar uma refração mais elaborada devido a dificuldade, mas as vezes é uma questão apenas de tomar mais tempo e de ter a colaboração do paciente para realizar uma refração bem elaborada de maneira a proporcionar uma acuidade visual satisfatória. No IOSB muitas vezes obtemos sucesso com os óculos e a adaptação de lentes de contato especiais nestes pacientes passa a ser opcional, lembrando que na imensa maior parte dos casos, com a adaptação de lentes de contato é possível obter uma acuidade visual consideravelmente melhor e muitas vezes chegar a 20/20 ou melhor.

Adaptação de Lentes de Contato Especiais

As lentes de contato especiais são mencionadas em todas as alternativas cirúrgicas, sendo muitas vezes necessárias mesmo após o procedimento. Naturalmente que se a cirurgia, seja qual for, possibilitar que o paciente possa atingir uma acuidade visual com óculos aceitável, satisfatória, na qual ele possa exercer suas atividades não precisa de lentes de contato ou estas passam a ser uma indicação relativa e não determinante para a melhor visão. É contudo importante mencionar que as lentes de contato são, na maior parte dos casos, a melhor alternativa para a reabilitação visual no ceratocone sem ou após qualquer cirurgia.

Muitos oftalmologistas que fazem segmento anterior tem alguma experiência com córnea, grande parte domina a adaptação de lentes de contato gelatinosas e descartáveis e alguns dedicam-se a adaptação de lentes rígidas gás permeáveis (RGPs), sendo que também a cada dia vemos crescer o número de especialistas iniciando a adaptação de lentes esclerais. As lentes mais indicadas para o ceratocone são as lentes especiais RGPs e esclerais, não irei comentar sobre lentes gelatinosas hidrfílicas especiais para o ceratocone uma vez que são poucos os casos onde elas possuem uma boa efetividade sozinhas, especialmente nos casos moderados, avançados e severos. 

As lentes especiais podem ser divididas em:

  1. Lentes RGPs monocurvas: Estas são lentes de curvartura posterior única, podendo ser esféricas ou asféricas (em forma elipsoidal) para um maior alinhamento junto a córnea.

  2. Lentes RGPs Especiais (tipo Soper): São lentes que possuem duas curvas-base posteriores, em forma de um "chapéu" que proporcionam um melhor acompanhamento da curvatura central sobre o ápice do ceratocone, a porção que está com uma protusão, geralmente central, da córnea. Quase todas as lentes especiais para o ceratocone originam-se na lente desenvolvida por nosso professor e amigo, Joseph W. Soper. A lente que meu pai e eu desenvolvemos era anteriormente chamada de Soper Modificada e com os avanços tecnológicos que introduzimos ela foi nomeada de lente Ultracone, com diferentes módulos e modelos.



    Vídeo: Adaptação de lente Ultracone (tipo SoperModificada)


  3. Sistema de Piggyback ou a Cavaleiro: Esta técnica consiste em adaptar lentes rígidas sobre lentes gelatinosas, o paciente tem que usar duas lentes em cada olho, sedo a gelatinosa por baixo. Embora esta técnica tenha sua validade e muitos experientes oftalmologistas optem por esta modalidade, em 51 anos de especialidade nunca fizemos ou nunca foi necessário no Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos (IOSB). Há uma grande disponibilidade de lentes descartáveis e gelatinosas que podem ser utilizadas para essa técnica que vise proporcionar maior conforto ao paciente. Por outro lado recebemos ao longo dos anos pacientes que acabaram desenvolvendo complicações com estas técnicas, em especial intolerância alérgica após algum tempo usando este sistema, as vezes alguns anos depois, as vezes até antes.        

  4. Lentes Esclerais: As lentes esclerais renasceram após cerca de mais de 30 anos após serem utilizadas nas décdas de 50, 60 e 70. Naquela época eram feitas em vidro ou em material acrílico (PMMA) e não proporcionavam adequada oxigenação a córnea. Isso fazia com que os pacientes pudessem usá-las por apenas 4 ou 5 horas no máximo ou usar por poucas horas, remover e depois colocar mais por cerca de 2 ou 3 horas, caso ultrapassasse esse tempo desenvolvia edema de córnea.

    Por volta de 2001, meados de 2002 meu pai, Dr. Saul Bastos me pediu que eu esrudasse sobre lentes semi-esclerais e esclerais, na época a internet serviu para alguma introdução ao tema mas principalmente os livros antigos dele da década de 70 me ajudaram muito. Depois, a indicação de eu procurar o professor dele em Boston, MA (EUA), Dr. Perry Rosenthal, MD PhD e um dos maiores especialistas em lentes esclerais do mundo, foi o início de uma longa jornada de estudos.

    Logo em seguida os fabricantes de matéria-prima começaram, por volta de 2004 e 2006 a desenvolver novos materiais de diâmetros maiores para a fabricação de lentes esclerais com materiais permeáveis ao oxigenio. Com isso, a Ultralentes foi pioneira no desenvolvimento e na fabricação de lentes esclerais nos modernos materiais gás permeáveis no Brasil e na América Latina. Tive a alegria e satisfação de ter contribuído no livro de Adaptação de Lentes de Contato do saudoso Dr. Cléber Godinho, eterno amigo, o primeiro capítulo sobre o tema de lentes esclerais da oftalmologia brasileira, sob o título Lentes Esclerais.⁶


     
                   Figs. 05 e 06: Lentes Esclerais SSB 17.5 mm e SB Full 19.5 mm.

    Hoje, fabricamos na Ultralentes lentes esclerais de diâmetros de até 21.0 mm de diâmetro, sendo divididas em corneo-esclerais de 14.5 a 15.5 mm, semiesclerais de diâmetros de 16.5 a 17.5 mm e lentes tipo full scleral de diâmetros de 18.5 a 21.0 mm. Estas lentes podem alcançar valores de SAG (alltura sagital) maiores que quaisquer outras lentes esclerais disponívels e com um desenhjo muito avançado, leve, estável e que permite excelente adaptação. (figs.05 e 06)


O Transplante de Córnea

Tranplante Manual e Automático ou Penetrating Keratoplasty (PKT)

A cirurgia de transplante de córnea evoluiu muito nas últimas décadas, inicalmente era realizada manualmente o transplante penetrante e os resultados dependiam muito da mão do cirurgião e sua curva de experiência e da qualidade das córneas capatdas pelos banco de olhos em todo o país. A recuperação do transplkante manual é de 12 a 18 meses até a cicatrização total. Com o advento do laser para remoção do botão afetado da córnea, preparação tanto do receptor como do enxerto os resultados tiveram uma melhora significativa e embora a recuperação seja mais rápida observamos ao longo do tempo que mesmo após 6 - 12 meses a topogafia corneana ainda sofria alterações por até mais tempo até estabilizar, mas sem dúvida que a qualidade da cirurgia é mais bonita, com encaixe melhor e menos astigmatismo iregular mais presente na técnica manual.

Transplante Lamelar 

O transplante lamelar foi um dos maiores avanços obtidos com a introdução da técnica automática com lasers de alta precisão. Estes sofisticados e caros equipamentos permitiram o desenvolvimento de técnicas como o Transplante Lamelar Profundo Anterior (Deep Anterior Lamelar Keratoplasty - DALK) e a ceratoplastia endoltelial (Endothelial Keratoplasty - EK) entre outras.

A técnica do transplante lamelar profundo oferece ainda uma melhor cicatrização e um menor números de adversidades como bem menor índices de rejeição, isso ocorre devido ao transplante ser de apenas uma camada da córnea que é removida e uma camada saudável é colocada ems eu lugar. Uma dificuldade desta técnica é que ela somente é viável se o paciente apresentar um voluime estromal compatível e seguro, pois caso contrario uma alteração "on the fly" pode se rnecessária e no meio da cirurgia o médico tenha que optar pelo transplante tradicional. A técnica lamelar tem ótima indicação se o paciente tiver alguma opacidade central superficial que possa ser removida com o procedimento. Devido ao fato de ela precisar ter um volume de córnea suficiente para remoção de uma camada, faz com que parte de sua indicação seja melhor em casos mais iniciais e moderados, com exceções pois neste estágio a adaptação de lentes de contato especiais tem grande apelo pelos resultados excelentes que proporcionam. 

Implante de Anel Intracorneano

A história do implante de anel intracorneano ou intraestromal inicia com os experimentos de Barraquer na Espanha, chamado de Intacs. Este foi desenvolvido inicalmente para correção de miopias e também para casos mais iniciais de ceratocone. Com o passar dos anos tivemos no Brasil o desenvolvimento de novos desenhos de anel intracorneano, como o desenvolvido pelo oftalmologista Dr. Paulo Ferrara que desenvolveu o Anel de Ferrara, este indicado para o tratamento do ceratocone. Com o passar dos anos novos modelos com nomogramas mais modernos e atualizados foram introduzidos para aprimiorar os resultados. A finalidade principal do implante de anel é criar uma superfície mais regular na córnea e assim proporcionar uma melhor acuidade visual, seja sem óculos, com óculos ou lentes de contato. Em nossa experiência pessoal no IOSB vimos vários casos, alguns tiveram resultados bons e referem que o implante ajudou mas ainda necessitam da adaptação de lentes especiais para uma melhor acuidade visual. Em alguns casos há relatos de não ter alterado muito a visão sem correção, outros de que houve piora. Isso pode em parte estar associado a cirurgições ainda em fase de curva de aprendizado uma vez que os cirurgiões mais experientes geralmente tem melhores resultados.

Importante mencionar que uma característica que observamos logo que começamos a ver os primeiros casos de implante de anel para adaptação e readaptação de lentes RGPs para ceratocone foi que a adaptação tornou-se mais complexa. Geralmente o segmento temporal e mais inferior cria uma elevação pontual na porção inferior do segmento, onde a lente rígida acaba tocando e induzindo a ceratite localizada e até mesmo erosão superficial. Este fenômeno é desconfortável para o paciente e inviabiliza o uso da lente rígida. Em meados de 2007 iniciamos o projeto de um desenho especial chamado Ultracone PCR (Pós-Implante de Anel), com diâmetro e zona óptica posterior maiores de maneira a sobrepor esta elevação. A vantagem deste desenho é que é extremamente personalizável e possibilita em muitos casos a readaptação de lente rígida. Em 2011 a revista Contact Lens Spectrum Magazine publicou um artigo que escrevi, inclusive sendo capa daquela edição, na qual trata desta dificuldade e de como desenvolvemos a lente Ultracone PCR. Para ver o artigo clique no link a seguir:
Fitting Keratoconus After Corneal Ring Implants - November, 2011

Alguns oftalmologistas utilizam a técnica do piggyback como alternativa para superar esta dificuldade e tem sucesso. No entanto a adaptação de dois pares de lentes e de dois sistemas de manutenção acabam tendo maior custo para o paciente e em alguns casos podem induzir a intolerância alérgica devido ao uso de lentes gelatinosas que não permitem a mesma lubrificação e oxigenação da córnea, mesmo quando lentes gelatinosas mais finas, descartáveis, são utilizadas. 

A adaptação de lentes esclerais a partir de 2008 facilitou muito a resolução de casos mais difíceis onde a presença do anel impossibilitava a obtenção de bons resultados com as lentes rígidas gás permeáveis (RGPs), pois estas sobrepoem toda a córnea e apoiam-se suavemente junto a esclera. (fig.07)


Fig.07: Adaptação de lente escleral SB Full pós-implante de anel.

Uma técnica que resultou em maior precisão na técnica foi a utilização do laser para perfazer os dutos de forma automática e muito precisa. Uma coisa que observamos com alguma frequência ao longo dos anos foi a imprevibilidade dos resultados, o que pode levar a frustração do paciente e de seus familiares que depositam muita esperança na técnica e depois observam que os resultados foram aquém do esperado. Isso é frustrante para o paciente e seus familiares e amigos que se enchem de esperança. Mas novamente é preciso levar em conta que dependerá muito da habilidade de planejamento e da execução da cirurgia.

Alguns cirurgiões podem optar pela combinação de tratamentos, combinando técnicas como implante com crosslinling de colageno de córnea com riboflavina, e até mesmo cirurgia topoguiada as vezes, não necessariamente nesta ordem. Acho que é muita agressão a córnea, me parece mais arriscado colocar uma córnea já fragilizada com uma resistência biomecânica alterada para ser submetida a uma série de procedimentos para remodelamento corneano. Mas a idéia do cirurgião é fantástica do ponto de vista teórico de que com isso as chances de obter um melhor resultado visual seja maior. Também foi observado que o implante de anel intraestomal sozinho não é suficiente para evitar um episódio de progressão no ceratocone.¹


Crosslinking de Colageno de Córnea com Riboflavina (CXL)

O protocolo de Dresdren

A cirurgia de crosslinking foi desenvolvida pelos oftalmologistas alemães Dr.Theo Seiller e Gregor Wollensak foi uma das maiores desobertas deste século. Seiller teve a ideia observando seu dentista utilizar uma luz azul (ultravioleta) para aumentar e velocidade de secura de um implante dentário, ele pensou naquilo e teve a ideia de experimentar em olhos de animais. Passados os testes inciais os primeiros casos operados poor ele foram por volta de 2001 e 2002. Lembro que meu pai esteve em Lipzig na Alemanha e foi aprender mais sobre a técnica uma vez que ainda eram muito escassas as informações ainda aqui no Brasil. A técnica demonstou ser eficaz no aumento da resistência biomecânica da córnea em mais de 70% dos casos, sem maiores complicações. A técnica consiste em remover o epitélio corneano (porção mais superficial da córnea), aplicar gotas de colírio de roboflavina sob uma luz ultravioleta controlada, por 30 minutos para que essa luz irradia agisse como um catalizador da ligação da riboflavina com o colágeno corneano, aumentando assim as suas ligações e promovendo uma maior resistância biomecânica. 

Alguns efeitos secundários se apresentavam como a formação de um haze corneano e diminuição do contraste que pode durar de alguns dias a até pouco mais de um mês mas depois melhora, e o fato de ser um procedimento bastante dolorido devido a remoção do epitélio corneano mas que pode ser  tolerado utilizando medicação para a dor, sendo que nos dia seguintes ao procdimento já está bem melhor e não há desconforto. Em alguns casos o procedimento pode gerar algumas reações inesperadas mas felizmente ele é bem seguro na maior parte dos casos.

Segundo o protocolo de Dresdren o crosslinking deve ter indicação (segura) quando o paciente é jovem,  quando houver a constatação inequívoca de progressão real de 1.5 - 2 ou mais dioptrias em seis meses, indicando que o paciente está passando por episódios de progressão e que a córnea tenha um mínimo de 400 micras de espessura em seu ponto mais fino. Não havendo a constatação de progressão ou queixa de queda da acuide visual neste período a orientação é acompanhar o caso. 

É importante ressaltar que as técnicas de transplante lamelar profundo (Deep Anterior Lamelar Keratoplasty - DALK), implante de anel intracorneano e o crosslinking tradicional (protocolo de Atenas) são melhor indicaados quando há um volme estromal suficiente para a realização do mesmo com maior segurança ou seja, é necessário que a córnea não esteja muito fina. Neste sentido a realização de exames para medir a espessura corneana como a paquimetria ultrassônica (considerada o padrão-ouro da paqumetria corneana) ou exames como o mapa de espessura corneana provido pelo Pentacam são importantes, assim como a analise criteriosa do cirurgião da biomicroscopia da córnea do paciente. 

Outros protocolos

Accelerated Crosslinking e Transepithelial Crosslinking (Epi-On)


Com a popularização do CXL surgiram novas tecnologias para aprimorar a técnica, uma delas é o crosslinking acelerado Accelerated Crosslinking que utiliza uma diferente concentração de ribloflavina para tornar o procedimento mais rápido Na verdade o trabalho do médico é proceder a desepitelização da córnea, depois o tratamento em si é feito com uma luz que fica a uma distância específica da córnea, com intensidade controlada e tem que pingar a riboflavina a cada 5 minutos, o que é um auxiliar de enfermagem pode fazer. Diminuindo o tempo do tratamento permite ao médico fazer mais procedimentos no período alocado para o paciente e também pode ser mais rápido também para o paciente.

Outra ténica é a realização do um crosslinking transepitelial (transepithelial crosslinking ou epi-on) onde não há remoção do epitélio corneano o que é bom para o paciente pois não é dolorosoa a recuperação. No entanto estudos demonstram que esta técnica é bem menos efetiva do que a técnica tradicional.

Cirurgia Topoguiada e Protocolo de Atenas (The Athens Protocol)

A presença de astigmatismo e miopia progressiva presente nas ectasias corneanas estão associadas a uma série de patologias, como ceratocone (a mais comum), ceratoglobo e degeneração marginal pelúcida. No entanto há na literatura uma ectasia mais recente oriunda da cirurgia refrativa, em especial a técnica do LASIK mas também em alguns casos de PRK.² ³ 

A técnica da cirurgia topoguiada e aplicação de crosslinking no mesmo dia em córneas estabilizadas, segundo o protocolo de Atenas mostra que há possibilidade de normalizar melhor a córnea proporcionando uma melhora visual para o paciente. Apesar de o pós-operatico apresntar haze e, em alguns casos, demora na reepitelização corneana, são poucos casos em relação ao montante de cirurgias realizadas. É cvonsiderado um tratamento terapêutico e não refrativo pois o objetivo é reduzir as iregularidades na córnea. Observa-se a dminuição de algums dioptrias de astigmatismo irregular mas também o aumento da miopia em até uma dioptria.

O crosslinking tradicional proporciona uma restabilização da córnea mas em alguns casos pode aumentar o astigmatismo residual, limitando a adaptação de lentes de contato devido ao aplanamento da córnea. Nestes casos a ablação parcial a laser (ou photorefractive keratotomy - PRK) topoguiada pode ser indicada. Novamente após o tratamento, caso os óculos não proporcionem ainda uma acuidade visual satisfatória que permita ao paciente exercer suas atividades, as lentes de contato especiais tem papel em proporcionar a melhor acuidade visual possível de obter. 


Tratamentos em estudo e/ou não consolidados

Radiofrequência

Um artigo de 2007, realizado na Universidade de Ciências da Saude de Alagoas, se propos a avaliar o uso da radiofrequência no tratamento do ceratocone. O estudo comenta que a técnica de termoceratoplastia⁴ foi abandonada por complicações e pela falta de previsibilidade. Na metade da década de 70 a termoceratoplastia foi modificada e reintroduzida por Gasset e Kaufman³. Estudos posteriores constaram índices de sucesso consideravelmente baixos e grande incidencia de morbidade apos o procedimento ou seja, agravo da condição.

Segundo este estudo conduzido pelos oftalmologistas João Marcelo Lyra, MD, PhD, Fernando Cancçado Trindade, MD, PhD, Daniela Lyra, MD, Antônio Bezerra, MD, PhD a radiofrequência foi reintroduzida recentemente (possivelmente anterior a 2007) para o tratamento da hipermetropia e consiste em aplicar uma energia de radiofrequência no estroma utilizando uma sonda de ponta. A sonda emite vibração que gera calor no estroma, fazendo com que ele diminua. A ponta da sonda é aplicada em pontos especificos de maneira a aumentar a curvatura central e assim neutralizar a hipermetropia. Este estudo não é a mesma técnica utilizada na termoceratoplastia mencionada anteriormente. 

O estudo conduzido pelos especialistas brasileiros apresenta uma técnica cirúrgica utilizando a radiofrequência e a aplicação em áreas de calor em posições modificadas. O objetivo é obter um remodelamento e melhor regularização da córnea em pacientes com ceratocone avançado.

A idéia do remodelamento corneano pela técnica da radiofrequência ainda encontra-se em estudo, no entanto ainda não é considerada uma téncia consolidada, mesmo com resultados promissores encontrados pelos notéveis autores.

Keraflex e Crosslinking de Colágeno Corneano Combinado

O procedimento de correção refrativa e topográfica através do Keraflex Microwave System consiste em um procedimento oftãlmico não incisional, baseado em microondas para aplanar a córnea sem a remoção de tecido. O tratamento leva menos de um segundo e é aprimorado através de um subconsequente tratamento utilizando o tratamento de crossling acelerado com o Avedro KXL System.

O procedimento para tratar o ceratocone inicalmente estava disponível apenas em ensaios clínicos e não estava comercialmente disponível exceto em alguns países como a Turquia. O tratamento por microondas é realizado em uma área circular central em menos de um segundo seguida de um resfriamento e da aplicação de crosslinking de colageno corneano. Os estudos demonstraramq ue os melhores resultados ocorreram  nos casos onde o CXL foi aplicado imediatamente após o Keraflex.

Casualmente em 2014 recebemos um paciente de Brasília submetido ao Keraflex+CXL (ao clicar no link direciona a um artigo sobre este caso), Ele estava na Europa e viajou a Turquia para realizar o procedimento. Embora não tivessemos exames pré-operatórios do paciente como topografia ou Pentacam ele tinha queixas de flutuação da visão. Conseguimos uma boa adaptação de lentes Ultracone, mas impressinou bastante a marca deixada pelo procedimento.⁵

Embora não seja uma técnica consolidada ainda encontra-se em estudos que podem aprimorar a tecnologia e trazer benefícios para muitos pacientes. Mesmo assim, como em todos os procedimentos, a adaptação de lentes de contato é um fator importante para a melhora da acuidade visual e especialmente córneas que foram submetidas a tratamentos pouco ou muito invasivos o ideal sempre é a adaptação de lenets RGPs ou esclerais de alta qualidade que permitem maior segurança e asseguram a saúde fisiológica da córnea.


Implante Estenopeico

Fig.08: Implante estenopeico

O médico mineiro Dr. Claudio Trindade desenvolveu uma técnica inovadora, embora de conceito antigo, para melhorar a acuidade visual de pacientes com a visão comprometida devido a córneas irregulares.

A técnica consiste em um implante de um dispositivo muito parecido com uma lente intra-ocular (LIO) utilizada na cirurgia de catarata mas com com uma coloração preta que bloqueia parte dos raios e um pequeno orifício (pinhole) que faz com que os raios luminosos entrem de forma mais paralela proporcionando uma melhora na visão (fig.2). Nas córneas irregulares os raios de luz chegam a retina de forma confusa e de diferentes ângulos devido ao astigmatismo irregular corneano. O princípio do Pinhole foi descoberto e desenvolvido desde o ínício do século passado e já havia um estudo similar de um dispositivo de lente intraocular (LIO) desenvolvido em 1992 pelo oftalmologista austríaco, Dr. VõrÖsmarthy através da mesma empresa que está desenvolvendo o dispositivo concebido pelo Dr. Trindade. Em Junho de 2017, publiquei aqui no blog um artigo sobre esta técnica, você pode acessar clicando neste link Técnica do Implante Estenopeico.

É importante salientar que a técnica envolve a estração do cristalino transparente e saudável para que seja feita a cirurgia e implante de uma lente intraocular (LIO) e o implante estenopeico fixado ao mesmo. Isso implica em uma cicrurgia de facoemulsificação de um cristialino saudável o que torna mais complexo o procedimento. Já a cirurgia feita em pacientes que tenham diagnóstico de catarata, mesmo que inicial fica melhor para a estração do cristalino. 

Outro ponto a ser analisado e tenho certeza de que o ilustre Dr. Trindade deve estar analisando é a questão da visão noturna. Nós todos temos aquela acomodação em baixa iluminosidade onde a pupila aumenta de tamanho e nos "acostumamos" com o escuro ou penumbra. No caso do implante estenopeico este efeito é neutralizado pois o diâmetro do filtro não aumenta de tamanho. Também desconheço se o implante estonopeico pode afetar o campo visual no olho operado ou seja, a visão lateral. Pelo que li, não houve alterações significativas destes achados no entanto já vi depoimentos de pacientes nas redes sociais que relataram os mesmos embora ainda assim estejam satisfeitos com o resultado.

Importante também mencionar o fato de que com a cirurgia de implante da LIO e do dispositivo estenopeico a córnea permanece inalterada. A possível necessidade de um paciente necessitar de transplante de córnea futuramente é algo que não se tem ideia de como isso poderá interferir na sua acuidade visual. Há a possibilidade de que uma nova intervenção seja feita para adequar o poder da LIO nestes casos. Desconheço se já houve algum caso neste sentido.

A técnica tem demonstrado excelentes resultados na reabilitação visual em pacientes com córneas extremamente irregulares, especialmente quando há indicação, ainda que precoce, de uma cirurgia de catarata não totalmente madura. O Dr. Cláudio Trindade recebeu em 2017 o prêmio máximo da Sociedade Americana de Catarata e Cirurgia Refrativa pelo trabalho expondo os detalhes da técnica e os resultados obtidos com o novo implante intraocular estenopeico. 


Discussão

A oftalmologia brasileira é uma das mais avançadas do mundo e não perde nada em relação ao que encontra-se em países como os EUA, Inglaterra e Alemanha, entre outros. Temos no Brasil vários especialistas com excelentes trabalhos, alguns nomes como o Dr. Paulo Ferrara e o Dr. Cláudio Trindade entre outros. As opções de tratamento do ceratocone disponíveis são diversas e contemplam diferentes situações. As tentativas de técnicas de remodelamento corneano e refrativas são importantes e tendem a ser aprimoradas nas próximas décadas. Atualmente a maior parte delas, em muitos casos, ainda terá o componente essencial da adaptação de lentes de contato especiais. O Brasil também conta com excelentes fabricantes de lentes de contato, entre grandes empresas e laboratórios menores. 

O avanço tecnológico na área da contatologia médica também é uma realidade, há anos contamos com a excelência oftalmológica na reabilitação visual com lentes de contato especiais. A Sociedade Brasileira de Lentes de Contato, Córnea e Refratometria (SOBLEC), que este ano está comemorando 50 anos de sua fundação, sempre teve importante papel na formação de novos profissionais e na difusão da especialidade. Muito me orgulha meu pai, Dr. Saul Bastos, ter sido um de seus fundadores em 1971 e também tenho muito carinho e orgulho de ter contribuido em algumas oportunidades, quando convidado, para colaborar cientificamente. 

Conclusão

Todas as técnicas, em especial as já consagradas e aprovadas tem sucesso em um número de casos, ainda que com algumas limitações, elas tem ajudado a uma parcela significativa dos pacientes. Em relação á adaptação de lentes de contato é imprescindível que sejam utilizadas lentes de contato de alta qualidade e tecnologia e de serem corretamente adaptadas. A adaptação de lentes de contato tem sido ao longo de várias décadas a principal alternativa que proporciona uma acuidade visual satisfatória e na maior parte dos casos permite aos pacientes recuperaram não somente uma melhor visão, mas como a sua autoestima, a autoconfiança de maneira a retomar as suas atividades, sejam elas laborais, esportivas ou sociais.

É inegável que tanto as técnicas cirúrgicas e a adaptação de lentes de contato especiais tem papela fundamental na melhoria da visão e da qualidade de vida de dezenas de milhares de pacientes, devolvendo-lhes a sua capacidade laborativa, social e educacional. A oftalmologia brasileira está de parabéns. Em alguns casos, com as técnicas cirúrgicas é possível o paciente usar óculos tendo uma qualidade razoável e satisfatória de visão.


Luciano Bastos
Diretor e Instrutor Clínico de LC Especiais
Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos - IOSB
Diretor e Consultor em LC Especiais
Ultralentes Ind. Óptica.


Obs. Nesta compliação de informações sobre o ceratocone não abordei estudos sobre a origem da patologia.




Bibliografia

1. Araujo, Bruno Schneider   Progressão do Ceratocone após Implante de Anel Corneano Intraestromal - Programa de Pós-graduação em Medicina: Ciências Cirúrgicas - UFRGS Porto Alenre - 2018  

2. Klein SR,Epstein RJ,Randleman JB,et al.Corneal ectasia after laser in situ keratomileusis in patients without apparent preoperative risk factors.Cornea.2006;25:388-403.

3. Binder PS.Ectasia after laser in situ keratomileusis. J Cataract Refract Surg.2003;29:2419-2429.

4. Gasset AR, Kaufman HE. Thermokeratoplasty in the treatment of keratoconus. Am J Ophthalmol 1975; 79:226–232

5.  Bastos, Luciano - Fitting post-Keraflex KXL Accelerated Corneal Cross-Linking (CXL) - Contact Lens Spectrum Magazine - March 2014.

6. Godinho, Cleber - Sobrinho, Marcelo et al - Casos Clínicos emLentes de Conttato Esclerais e Semiesclerais - Ed. Cultura Médica 2a. Ed.Cap. 38, 
2010 págs 301 a 313.   

TAGS: #ceratocone #lenteescleral #implantedeanel #transplante #córnea #oftalmologia 
#lentes #esclerais #lentesrígidas #IOSB #SaulBastos #LucianoBastos #Ultracone #SSB #SBFull
#Ultralentes #crosslinking #estenopeico 

segunda-feira, 29 de março de 2021

Colírio para tratamento de ceratocone, você já ouviu falar?

Bastante promissor o estudo desta medicação chamada IVMED-80 que consiste na verdade em um tratamento de crosslinking transepitelial mas com uma posologia para aplicaçã ou seja, não é uma aplicação única e sim pingar o colírio do medicamento por um determinado tempo. Um dos inconvenientes do crosslinking tradicional é a necessidade de raspagem do epitélio corneano, o que torna muito dolorido o pós-operatório especialmente no dia seguinte, e também a limitação de uma espessura mínima da córnea de 400 micras (crosslinking tradiciona, protoloco de Dresden), o que limita para alguns casos.

O estudo é recente e tem um "n" baixo, foram cerca de 31 pacientes que concluiram o estudo, logo como foram três grupos, sendo dois que receberam o tratamento de formas diferentes e um terceiro com placebo (teste duplo-cego randomizado), mesmo assim os resultados são otimistas e condizem com os observados na técnica tradicional. O crosslinking transepitelial que é realizado utiliza ainda o raio ultravioleta que seria um catalizador do processo, apenas neste caso não há a raspagem do epitélio corneano. No caso deste medicamento IVMED-80, pelo que se vê é um tratamento com uma certa duração e "provavelmente" conta com a iluminação natural do sol para agir como catalizador, mas no artigo fica claro que o processo é farmacológico ou seja, a indução farmacológica da droga para induzir o crosslinking.

"O IVMED-80 é uma droga que regula positivamente a lisil oxidase (LOX) e induz o crosslinking corneano farmacologicamente."

O estudo ainda está em fase 2, devendo entrar agora em fase 3. É importante observar os resultados a longo prazo e estabelecer quais os critérios para sua aplicação assim como definir protocolos de utilização. Também importante observar os casos a longo prazo para saber se como no crosslinking tradicional ainda se observa alguma alteração topográfica, mesmo que pequena.

Enfim é uma boa notícia para os casos especialmente dos pacientes mais jovens que estão mais propensos a episódios de progressão e aos casos mais raros de pacientes com mais de 30 - 40 anos que ainda apresentam episódios de progressão. É importante saber quais os fatores que podem contraindicar o tratamento.Segue abaixo link para o artigo da Dra. Juliana Rosa*.

Comentários por Luciano Bastos

 Colírio IVMED-80 no tratamento do Ceratocone

*Autora: Dra. Juliana Rosa
Pós graduação Lato Sensu em Córnea pela UNIFESP ⦁ Especialização em lentes de contato e refração pela UNIFESP ⦁ Residência médica em Oftalmologia pela UERJ ⦁ Graduação em Medicina pela UFRJ ⦁ Contato via Instagram: @julianarosaoftalmologia

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

CERATOCONE: LENTES RÍGIDAS OU ESCLERAIS?

Excelente pergunta, e resposta complexa.

Dez pontos a considerar em relação a ambas opções:


1. O ceratocone nem sempre se apresenta de uma mesma forma. Conforme a posição, tamanho e forma do ceratocone as lentes rígidas podem apresentar diferentes resultados.

2. Deve-se levar em conta que existem pelo menos uns quatro fabricantes de lentes rígidas para ceratocone no Brasil. Cada um tem seu desenho e os resultados variam muito pela tecnologia, qualidade e regularidade de resultados.

3. A lente Ultracone (figura 1) foi desenvolvida pelo oftalmologista Dr. Saul Bastos, pioneiro na adaptação de lentes rígidas especiais no Brasil. No início chegou a ser o principal e mais importante cliente de todos os demais fabricantes. Em 1986 ele fundou a Ultralentes junto com seu filho Luciano Bastos para melhor a qualidade das lentes e das adaptações feitas no hoje Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos - IOSB.  Anteriormente ele usava lentes de outros fabricantes e tinha que polir e modificar todas no consultório e muitas vezes vinham com pequenos erros.


Fig. 1. Adaptação perfeita da lente Ultracone.

4. A Ultralentes então ao longo do tempo sempre teve um foco na qualidade e no desenvolvimento tecnológico das lentes e surgiu a Ultracone que hoje possui quatro módulos de diferentes modelos para diferentes níveis de complexidade do ceratocone. E é de longe a lente rígida que oferece os melhores e mais consistentes resultados comparada a qualquer outra lente rígida. A regularidade de ótimos resultados é surpreendente e muitos oftalmologistas no Brasil, alguns dos mais experientes, adaptam rotineiramente as lentes Ultracone.

5. Mesmo assim no IOSB - Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos onde adaptamos as lentes Ultracone com grande sucesso e também as esclerais SSB e SB Full da Ultralentes tem casos onde a escleral tem melhor indicação conforme o caso. As lentes esclerais tem a vantagem de por não tocarem a córnea e não terem mobilidade proporcionam grande conforto ao paciente. Também protege o olho da entrada de corpo estranho (ciscos), da poeira ou fumaça, além de manter os olhos lubrificados durante o uso, o que gera um "ecossistema saudável" para a fisiologia da córnea. A desvantagem é a colocação e remoção que é um pouco mais demorada que as lentes rígidas. 


Vídeo: Lente Ultracone Absolute.

6. Tem pacientes adaptados com as lentes Ultracone que sequer pedem-nos para testar esclerais pois estão perfeitamente adaptados a elas. Nos sempre informamos as opções de lentes e materiais novos aos pacientes. Tem pacientes que eram perfeitamente adaptados ás lentes Ultracone mas optaram pelas lentes esclerais SSB ou SB Full Scleral devido ao conforto ainda maior e mais segurança por ela não deslocar nunca.

7. Do ponto de vista profissional e pela postura ética e pelo protocolo deve-se iniciar os testes com as lentes rígidas, no caso do IOSB a Ultracone e conforme for se parte para a escleral. Essa é uma postura ética, deve-se sempre mencionar ambas alternativas e discutir com o paciente e conforme testar uma e outra, explicando todas as questões envolvidas, até mesmo o custo de cada opção.






"O foco deve ser sempre o melhor possível para o paciente."






8. Tem muitos casos nos quais ambas as opções podem servir ao paciente e procuramos sempre colocar as “vantagens e desvantagens” de cada uma das opções para o paciente. Tem casos em que testamos as duas e ambas ficaram excelentes e no fim o paciente decide ficar com a Ultracone ou com a lente escleral. Há também pacientes que fizeram a adaptação das duas modalidades para usarem conforme a circunstância, tendo as duas opções a disposição.

9. Outros fatores que tem influência nos resultados da adaptação tanto de uma como de outra lente são; a experiência e preparo do profissional, as opções de lentes que ele dispor e a o cuidado de orientar bem o paciente, dando-lhe todas as informações necessárias e tirando suas dívidas. Isso requer conhecimento. Uma consulta de paciente com ceratocone ou casos pós-cirúrgicos como pós-implante de anel ou pós-transplante de córnea não pode ser realizado em apenas 15-20 minutos, salvo em alguns casos. É preciso orientar, conversar e dar a devida atenção ao caso. O paciente de ceratocone é uma pessoa fragilizada pela diminuição muitas vezes incapacitante da visão e está ávido por informações e maior segurança, tanto ele como familiares, amigos, etc.


Vídeo: Lente escleral SB Full Scleral em caso de ceratocone

10. O foco deve ser sempre o melhor possível para o paciente, se lentes rígidas ficarem boas e forem de boa qualidade e diretamente adaptadas o paciente terá sucesso com elas. O mesmo vale para esclerais, precisam ser de boa qualidade e bem adaptadas, o paciente deve ser muito bem treinado e orientado a manusear, limpar, colocar e remover as lentes. 
 
As complicações de lentes esclerais podem vir um pouco mais tardiamente pois elas se apoiam sobre a conjuntiva escleral que tem menor sensibilidade. Isso tem sido bastante observado no IOSB com pacientes que nos procuram por complicações do uso de lentes esclerais, quando se observa o caso constata-se que as lentes não estão corretamente adaptadas ou tem uma qualidade sofrível que dificilmente se percebe se não houver grande experiência do oftalmologista.

Qualquer que seja o modelo, a qualidade, a tecnologia e a experiência do adaptador são cruciais na obtenção de bons resultados.


Luciano Bastos
Diretor e Instrutor Clínico de Lentes Especiais
IOSB - Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos


Diretor e Consultor em LC Especiais
Ultralentes

Colunista da Contact Lens Spectrum Magazine

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Sobre os Tratamentos Atuais para Ceratocone.

Respondendo a uma pergunta no grupo Ceratocone & Tratamentos no Facebook acabei me alongando na resposta e percebi que muitas pessoas gostariam de ter uma ideia dos tratamentos disponíveis no Brasil e no mundo para o ceratocone. Fiz uma síntese destas técnicas e procuro explicar da forma mais compreensível possível. Um fato muito bom é que a Oftalmologia Brasileira está no mesmo nível da praticada no primeiro mundo e em nada deve em relação a técnicas e tecnologias. Isso é maravilhoso, precisamos apenas que esteja mais disponível para mais pacientes, mas nós vamos chegar lá.

Transplante de Córnea

Todo e qualquer tratamento que envolva procedimentos apresentam algum grau de risco. De todos os tratamentos o que envolve maior risco é o mais invasivo que é o transplante de córnea. Claro que esta cirurgia evoluiu muito nas últimas décadas e com técnicas menos invasivas como o transplante lamelar profundo mas mesmo a técnica tradicional chamada penetrante também evoluiu muito, especialmente quando realizada de forma automatizada com o laser de femtosegundo. Esta cirurgia tem um propósito nobre de renovar a porção central da córnea quando não é mais possível obter uma acuidade visual satisfatória devido a cicatrizes e opacidades ou a dificuldade na correção total do astigmatismo irregular por lentes de contato. O risco maior sempre é a rejeição e como se dará o tratamento e prognóstico devido a necessidade de uso (as vezes excessivo) de medicações com corticoides que podem causar glaucoma e catarata precoce. Mas os resultados na maior parte dos casos é benéfica para os pacientes, muitas vezes possibilitando que o uso óculos (o que antes não era possível) após a cicatrização e estabilização da cirurgia.

Em alguns casos pode ser necessário a adaptação de lentes de contato especiais, especialmente quando após a estabilização a córnea apresente um astigmatismo irregular elevado, o que pode ocorrer. Nestes casos atualmente a adaptação de lentes esclerais de alta qualidade com materiais de altíssima oxigenação e sistema de ventilação no desenho das lentes (como as da Ultralentes) permitem uma ótima adaptação, uma excelente acuidade visual e especialmente a manutenção da saúde fisiológica da córnea.

Implante de Anel Intracorneano

Já a cirurgia de implante de anel que serve para melhorar a regularização da superfície corneana, procura diminuir o máximo possível do astigmatismo irregular e assim proporcionar melhor resultado visual com e sem correção. A técnica também avançou muito com novos modelos e formatos de anel mas infelizmente não funciona em todos os casos. Geralmente funciona melhor em casos mais iniciais e moderados. Os riscos são bem menores em relação a técnica mais invasiva como o transplante de córnea e embora possam ocorrer complicações, geralmente o oftalmologista pode resolver sem maiores dificuldades.

Há duas maneiras de realizar o implante, pela técnica manual (cirurgião que faz os dutos dos segmentos) ou a automática pelo laser de femtosegundo, uma técnica muito precisa na qual os dutos onde serão inseridos os segmentos do anel intracorneano são feitos a laser com muita precisão. Em relação ás técnicas, cirurgiões experientes afirmam que a cirurgia pode ser realizada manualmente com grande precisão, especialmente quando o cirurgião já tem uma boa curva de experiência na técnica.

Em relação aos resultados, talvez por geralmente recebermos no IOSB os casos onde não houve um bom resultado na resposta visual pós-cirúrgica, me incomoda um pouco a questão da pouca previsibilidade dos resultados. O cirurgião sempre se dedica a fazer o melhor e buscar um resultado que diminua o astigmatismo irregular, que diminua ao menos um pouco o grau total do erro refrativo do olho do paciente, no entanto as vezes os pacientes sentem que não houve mudança, ou que foi pouca melhora ou até que piorou. É controvertido pois pode-se pensar que talvez um cirurgião tivesse feito de uma forma e outro de outra, então é difícil afirmar que o implante não adiantaria naquele paciente específico, mas o fato é que estes pacientes existem. E tem o lado bastante positivo que é o dos pacientes que beneficiaram-se da técnica e que ajudou ou melhorou muito a sua acuidade visual em relação a antes do procedimento.

Quando o implante não proporciona uma boa visão com ou sem correção por óculos, novamente as lentes de contato especiais tornam-se a alternativa a ser seguida para a reabilitação visual do paciente. E após a adaptação do anel, há um ligeiro aumento na dificuldade da adaptação de lentes de contato rígidas, pois há uma pequena elevação, geralmente na extremidade do segmento inferior, que faz com que ocorra um toque na superfície da lente rígida, ocasionando ceratites recorrentes e desconforto no paciente. Em 2011 escrevi um artigo que foi publicado na Contact Lens Spectrum Magazine (foi capa da edição de Novembro de 2011) sobre as dificuldades de adaptar lentes para ceratocone pós-implante de anel e como desenvolvi desenhos especiais para literalmente sobrepor o problema. Foi a partir de 2005 que comecei a desenvolver os módulos da lente rígida gás permeável Ultracone chamados de PCR (Post-Corneal Ring) e IL (IntraLimbal).

Em meados de 2008 lançamos de forma pioneira no Brasil as modernas lentes esclerais gás permeáveis, inicialmente com diâmetros de 16 mm. A partir de 2010 já estávamos fabricando na Ultralentes lentes esclerais de diâmetros até 19.5 mm. As lentes esclerais representam uma excelente solução para os casos de adaptação pós-implante de anel. A lente escleral sobrepõe a córnea de limbo a limbo, evitando qualquer contato com a córnea, preservando totalmente a sua integridade. As lentes esclerais da Ultralentes também contam com tecnologia própria, de canais de ventilação invisíveis a olho nu (tecnologia desenvolvida por mim, chamada de Spline Wave Technology. A adaptação de lentes esclerais permite excelentes resultados e com as diversas opções de personalização das lentes SSB e SB Full Scleral temos obtido resultados fantásticos com estas lentes.

Crosslinking

É comum vermos os pacientes em redes sociais falando sobre esta técnica, muitos referem-se a ela simplesmente como "crosslink" mas a denominação correta é "crosslinking".

A técnica do crosslinking do colágeno de córnea com riboflavina sob luz ultravioleta tem a finalidade de aumentar a resistência biomecânica da córnea para evitar a sua progressão. Incialmente, pelo protocolo de Dresden a técnica tem indicação somente quando há basicamente a constatação inequívoca de progressão em um período de 6-12 meses aproximadamente e que a córnea tenha uma espessura mínima de 400 micras no seu ponto mais fino. Este procedimento é feito após o médico realizar uma raspagem do epitélio corneano na sua porção central para facilitar a absorção da riboflavina. Embora seja mais efetiva a ação causa algum desconforto (dor) no pós-operatório (dia seguinte), nada que não possa se tolerar com o uso de analgésicos. Há alguns casos de complicações mas são raros. Nos já vimos dois casos no IOSB.

Posteriormente se desenvolveu novas técnicas do crosslinking (CXL) que consistem no CXL acelerado, na combinação de técnicas de formas diversas como anel+CXL ou PRK (cirurgia refrativa)+CXL entre outras. Chama-se a está maior liberdade de técnicas de Protoloco de Atenas quando decidiu-se que o cirurgião teria liberdade para planejar a cirurgia combinada da forma que ele entendesse que seria a mais adequada ao paciente.

Em termos comparativos fica muito difícil realizar uma análise precisa dos resultados devido a diversidade de tecnicas combinadas, exceto se houver um estudo que preconize um protocolo específico realizado por um especialista ou mais que utilizem a mesma técnica em vários pacientes. A grande questão é que a córnea é um dos orgãos mais nobres e delicados, frágeis que existem, o modelamento da córnea, embora seja um desejo tanto do cirurgião e do paciente, é difícil de se obter. A córnea pode responder ao "insulto" de uma intervenção de diferentes formas e até mesmo agravar o quadro se houver remoção de muito tecido ou uma tentativa de ir mais adiante para melhorar o resultado, portanto é preciso cautela.

Crosslinking Transepitelial

Também existe a técnica do crosslinking transepitelial que consiste em utilizar uma riboflavina modificada com moléculas menores de forma que possa ser aplicada sem a raspagem do epitélio corneano. Isso do ponto de vista do pós-tratamento é bem melhor e mais confortável para o paciente mas a literatura mostra que tem menor eficácia que o método tradicional com a raspagem. Os estudos no sentido de aprimorar esta técnica, bem menos invasiva, são muito bem-vindos. Neste caso o objetivo a ser buscado é unicamente o fortalecimento da resistência biomecânica da córnea como no caso do crosslinking tradicional, segundo o protocolo de Dresden. 


Implante Estenopeico


Finalmente existe a técnica do implante estenopeico desenvolvida pelo Dr. Trindade que tconsistir em remover o cristalino transparente e saudável do paciente, implantar uma lente intraocular (LIO) como se fosse uma cirurgia de catarata e junto dessa lente prender junto uma lente escura com um pequeno orifício por onde passa a luz.

Está técnica pode ajudar muito a quem não tem outra alternativa mas deve ser vista com muita cautela porque apresenta sim outros riscos. É importante verificar a retina do paciente, a pressão intraocular e demais estruturas. No caso do paciente com ceratocone uma eventual necessidade de transplante futuro é algo que ainda teremos que saber como irá reagir a visão. O implante estenopeico diminui um pouco a visão periférica e diminui a capacidade de se acostumar com a luz baixa ou a noite pois chega menos luz na retina devido ao implante bloquear parte destas luzes e permitir somente que as luzes que entram frontalmente cheguem na retina.

Adaptação de Lentes de Contato

Embora a adaptação de lentes de contato não possa ser considerada uma forma de tratamento para o ceratocone é largamente a melhor e mais eficaz maneira de proporcionar a reabilitação visual dos pacientes de ceratocone na maior parte dos casos onde o ceratocone já cria dificuldade para uma correção visual com óculos. 

Para falar de lentes de contato especiais e reabilitação visual, que é nossa especialidade há mais de 50 anos, precisaria de um capítulo a parte. São muitas as opções de lentes especiais de diversos fabricantes, cada um tem seus desenhos e muitas vezes os resultados são muito bons. As lentes que melhor proporcionam uma melhor acuidae visual são as lentes rígidas especiais e as lentes esclerais. Há também lentes gelatinosas para o ceratocone, lentes híbridas e a técnica do piggyback (lente rígida em cima de uma gelatinosa). 

A adaptação de lentes de contato especiais responde pela maior parte das técnicas para corrigir melhor o defeito refrativo de pacientes com ceratocone e com astigmatismos irregulares pos-cirúrgicos, assim como ametropias elevadas. O ideal é que os pacientes procurem especialistas experientes e que trabalhem com fabricantes que desenvolvam suas soluções, estes tem maior flexibilidade para personalização das lentes conforme a necessidade. No entanto mesmo fabricantes que utilizam tecnologias sob licença de uma marca internacional dispõem de boas lentes e soluções que ajudam muito na obtenção de bons resultados.

domingo, 1 de dezembro de 2019

Uma luz sobre o Ceratocone para 2020

É sempre importante esclarecer estas dúvidas. Ao longo de mais de 30 anos com pacientes do Iosb Reabilitação Visual e de mais de 15 anos de convívio com pacientes de ceratrocone no grupo Ceratocone & Tratamentos (desde o tempo do Orkut) me deparei com este tipo de indagação ou dúvida. Não é incomum comentários de que os médicos ou mesmo cientistas não estão preocupados com a "cura" do ceratocone pois isso de certa forma os beneficiam financeiramente. Equívoco grande e que em nada ajuda o paciente.
Vamos lá.
Até meados de 1990 somente existia a opção de adaptar óculos, lentes de contato especiais ou transplante de córnea. Existiam algumas cirurgias invasivas com a finalidade de diminuir a curvatura da córnea (incisão em cunha), ai surgiu o anel intracorneano que embora tenha sido inventado por Barraquier na Colômbia, teve uma versão nacional, diferente, desenvolvida pelo Dr. Ferrara. Com isso, muitos pacientes foram e são submetidos desde então a essa técnica que para alguns funcionou ou ajudou e para outros não. Importante também mencionar o avanço no desenvolvimento de novos nomogramas do anel que visam apresentar resultados melhores.
Nas décadas a seguir surgiram novos métodos de transplante de córnea com o uso de femtosecond laser que permitiu cortes e botões de córnea mais perfeitos, recuperação mais rápida (de 18 meses do tradicional manual para 6 - 10 meses para o laser), surgiu também a técnica do transplante lamelar utilizando também o femtosecond laser (essa técnica serve apenas para casos onde há uma boa espessura corneana e permite a remoção apenas de uma camada da córnea) também com resultados melhores.
Na década do novo milênio, mais precisamente em 2001, surgiu o crosslinking de colágeno corneano com riboflavina sob luz ultravioleta, criado por Theo Seiler e Wollensak este método é o original e foi então criado o Protocolo de Dresdren. Havia muita expectativa sobre a segurança e eficácia desde tratamento, foi preciso aguardar alguns anos para que ele provasse ser eficaz em cerca de 76% dos casos (se não me engano). Em 2003, meu pai, Dr. Saul Bastos, esteve na Alemanha em Leipzig para observar os estudos, ficou otimista quanto a aplicação mas o problema é que o ceratocone não era resolvido, somente estacionado. Desde o surgimento surgiram inúmeros estudos sobre técnicas aceleradas e menos invasivas (sem a remoção do epitélio corneano, chamado de trans-epitelial) para se aprimorar a técnica e poder realizar em casos mais avançados onde a córnea estava mais fina e portanto contraindicada para o crosslinking tradicional (mínimo de 400 micras no ponto mais fino).
Em seguida, anos depois surge o Protocolo de Atenas que foi criado de maneira a permitir que o cirurgião pudesse decidir, embora não exista um protocolo rígido), eleger uma combinação ou sucessão de procedimentos (já existentes e conhecidos) de maneira a tratar o ceratocone mais agressivamente no sentido de obter melhores resultados visuais para o paciente.
Somando-se a isso, existem muitos pesquisadores em biotecnologia e biomedicina estudando a origem e como se dá o surgimento e a progressão do ceratocone. Os oftalmologistas são sim parte deste processo mas este estudo é mais laboratorial, os estudos devem ter equipes que trabalham juntas para produzir resultados científicos relevantes. Descobriu-se um gene que é comum nos casos de ceratocone mas os próprios pesquisadores afirmam que ainda estão engatinhando nesse sentido, que há muito mais a ser pesquisado. O interessante é que desde a década de 60 e 70, os livros de oftalmologia (de córnea) já falavam que o ato de coçar os olhos com força é sem a menor dúvida um importante fator para o desenvolvimento da patologia. Todas as pesquisas mais atuais também mencionam isso.
Neste tempo todo sempre houve uma grande dedicação e empenho no sentido de melhorar a qualidade de vida dos pacientes de ceratocone, sempre de recuperar a visão e evitar se possível cirurgias mais invasivas. Ai entram as lentes de contato que, infelizmente, alguns acreditam, de forma absolutamente equivocada, que se trata de "uma maneira do médico ganhar dinheiro". Não é assim, ao menos não é bem assim. Explico a seguir.
Qual o principal problema que o ceratocone provoca? A perda ou diminuição da visão de boa qualidade na qual o paciente precisa para exercer suas atividades, desde pessoais, familiares, sociais e de poder estudar e trabalhar. Ainda hoje, digamos que já estamos praticamente em 2020, a técnica que melhor resolve esta situação, de forma inequívoca, são as lentes de contato especiais, sejam rígidas ou esclerais. São lentes de contato de maior complexidade geométrica, precisam ter boa qualidade para o paciente ter conforto e boa adaptação e em muitos casos são capazes de proporcionar uma visão perfeita onde qualquer outro tratamento não chegaria. Cada caso é um caso, mas na imensa maior parte dos casos essa é uma constatação, fato.
Sempre existiram bons fabricantes de lentes no Brasil e as alternativas de lentes para ceratocone também aumentaram muito nas últimas décadas.Alguns pacientes preferem um tipo de lentes ou tem trauma do uso de lentes por terem tido experiências desastrosas com lente mal-adaptadas ou de qualidade baixa. É importante compreender que existem diferenças nas lentes fabricadas por cada fabricante, o paciente tem o direito de ter acesso a experiência de testar todas as que ele julgar necessário. A função das lentes é a reabilitação visual e não deter sua progressão. No entanto, na nossa longa experiência, lentes boas e bem adaptadas ajudam no sentido de não criar situações onde possa despertar novos episódios de progressão, principalmente por provocar a vontade de coçar os olhos. Lentes boas e bem adaptadas são saudáveis fisiologicamente.
E sobre as lentes de contato, meu pai foi médico oftalmologista pioneiro no Brasil na reabilitação visual de pacientes com ceratocone, pós-transplante e outras atrofias da córnea. E desde a década de 70 sempre houve muita dedicação, pesquisa, inovações tecnológicas e aprimoramento no sentido de obter resultados cada vez melhores. Estes anos que passamos nos EUA e na Europa, trabalhando, estudando e se aperfeiçoando não foram e nem são baratos. Exigiu muita disciplina e foco no sentido de que isso pudesse nos ajudar a desenvolver as melhores e mais aperfeiçoadas lentes de contato especiais para a reabilitação visual dos pacientes com ceratocone e demais casos de córneas irregulares, as lentes da Ultralentes são todas desenvolvidas por nós, nenhuma paga Royalties, mas os insumos desde a matéria-prima e até parte dos insumos indiretos são sim importados, em dólar e em libras esterlinas.
As lentes de contato evoluíram muito também, até meados de 1980 elas eram feitas apenas em acrílico o que fazia com que se utilizadas por muitas horas no dia provocavam edema de córnea. Meu pai com o aperfeiçoamento do desenho da lente Soper (de nosso professor Joseph W. Soper), aprimorou o desenho da lente (que acabou criando a Ultracone) e com isso permitia que os pacientes do IOSB usassem as lentes sem apresentar sinais de edema, aumentando a oxigenação pela excelência na troca lacrimal que carrega oxigênio para a córnea por debaixo da lente. Por isso que você ao ver fotos e vídeos da Ultracone que eventualmente posto aqui com aquele verde por debaixo da lente (fluoresceína que comprova a presença e troca lacrimal). Ao longo das décadas de 80, 90 e no novo milênio os materiais utilizados na fabricação de lentes de contato evoluíram bastante também, proporcionando ainda melhor relação fisiológica da lente com a córnea, embora seja fundamental o desenho da lente ser de alta qualidade e tecnologia, se não não adianta usar o melhor material que existe.
Por volta de 2002 meu pai pediu que eu estudasse as lentes esclerais, me falou quem eu deveria procurar para aprender (um professor dele nos EUA chamado Dr. Perry Rosenthal). Ele foi fundamental na minha educação e preparo em lentes esclerais (veja uma citação dele neste link ) Eu comecei a estudar nos livros antigos pois as lentes esclerais são antigas, não são de agora como muitos pensam, apenas foram substituídas pelas lentes rígidas por apresentarem melhores resultados fisiológicos que as esclerais que naquela época não eram permeáveis ao oxigênio como agora. E desta forma, meu pai, um visionário, me provocou no sentido de estudar e já começar a desenvolver estas lentes tão logo os fabricantes de matéria-prima se dessem conta de que seria um caminho saudável a seguir. Não deu outra, em 2006 recebi as primeiras amostras de materiais de lentes esclerais, tudo era novo, era um bloco maior, não cabia nos equipamentos e então comecei uma longa preparação, trocando equipamentos, fazendo alterações em equipamentos pré-existentes para inciar os testes.
Em meados de 2008 iniciamos, pioneiramente no Brasil, as primeiras adaptações em pacientes antigos do Iosb Reabilitação Visual e os resultados que observamos durante e um ano depois foram muito animadores. Desde então o Iosb Reabilitação Visual já adaptou cerca de 3000 pacientes com lentes esclerais SSB e SB Full Scleral, dos menos aos mais complexos casos onde nenhuma outra escleral fabricada no Brasil ou na América Latina consegue chegar, casos desde simples com esclerais menores até casos como alguns que postei aqui recentemente com diâmetros entre 19 e 21.0 mm.
O que ocorre é que o paciente de ceratocone hoje se transformou, por parte de "alguns" especialistas, em um "nicho de mercado", sim, veem os pacientes não como uma pessoa que precisa do seu melhor, mas uma oportunidade para uma cirurgia ou para lentes de contato, então todos hoje são "***especialistas***". Claro que isso não é a regra, felizmente, mas não é raro vermos relatos de membros aqui da comunidade ou de pacientes do Iosb Reabilitação Visual dizendo que o médico ofereceu fazer crosslinking, implante de anel e depois adaptar lentes de contato. Mas o paciente tinha 35 anos, ceratocone estabilizado já há alguns anos, sem episódios de progressão. Este é um exemplo apenas mas como disse, felizmente a maior parte dos especialistas tem na sua conduta estudar o que é melhor para o paciente e isso inevitavelmente em muitos casos passa pela reabilitação visual.
Bem, espero que com este texto eu possa ter esclarecido a maior parte de suas dúvidas, assim como dado uma luz sobre algumas obscuridades que giram em torno deste tema.
Estamos a disposição para colaborar, tanto com pacientes mas especialmente com médicos oftalmologistas interessados na reabilitação visual de casos de alta complexidade. Nosso trabalho, embora muito discreto mas estritamente científico é todo feito para proporcionar e disponibilizar aos oftalmologistas credenciados e aos novos que nos procuram, por soluções de alta tecnologia e qualidade excepcional para resultados cada vez melhores.

Luciano Bastos
Diretor Ultralentes
Diretor do Instiututo de Olhos Dr. Saul Bastos (IOSB)