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domingo, 30 de dezembro de 2012

Ceratocone: Início, meio e fim




Ceratocone avançado, indicação relativa de transplante
O ceratocone, como muitas outras patologias, deveria ter um início, meio e fim, sendo o início quando o paciente primeiro começa a sentir a queda na qualidade da visão e em seguida o diagnóstico. Após o diagnóstico vem a proposta de tratamento oferecida pelo oftalmologista que pode variar desde a prescrição de óculos (pelo protocolo deveria iniciar assim quando possível), a adaptação de lentes de contato e os tratamentos cirúrgicos dos menos aos mais invasivos. A esperança do paciente e de seus familiares é que se chegue a um resultado ao fim, como no título.



Não é tão simples assim

Embora o ceratocone não cause cegueira (irreversível) pode ser bastante debilitante para a visão do paciente caso nenhum tratamento seja feito. Após um diagnóstico preciso e indubitável o passo seguinte é "o que fazer?" Óculos, lentes, cirurgia... basicamente são estas as opções para o paciente diagnosticado. Embora o protocolo siga nessa orientação acima (Óculos, lentes, cirurgia...) não é incomum alguns casos serem incorretamente diagnosticados com ceratocone. Muitas vezes casos de astigmatismo corneanos mais curvos onde a córnea do paciente já era naturalmente mais curva ou casos de astigmatismo corneano nos quais a interpretação equivocada de uma topografia leva a um diagnóstico precoce e incorreto de ceratocone ou a falsa presunção de que a simples descoberta da patologia (em caso de diagnóstico correto) seja de que a mesma irá desenvolver ou progredir indefinidamente, outro motivo que leva médicos a indicarem procedimentos de forma precoce sem ter o devido acompanhamento. Felizmente estes são poucos casos mas ocorrrem com certa freqüência. Existem inúmeros depoimentos e constatações deste fato.


O que fazer?

O ideal é que o paciente após receber o diagnóstico ou a notícia da suspeita, seja acompanhado pelo médico que deverá iniciar a análise do caso através de exames sequenciais e de consultas de rotina. Consultas e exames nos quais ele poderá comparar exames (preferencialmente de tomografia se segmento anterior) a cada seis meses e do exame da acuidade visual do paciente e da prescrição de óculos ou da adaptação das lentes de contato (preferencialmente RGP's). Juntamente com o acompanhamento o médico deverá instruir o paciente e seus familiares de como proceder. Dicas como evitar coçar os olhos, pingar colírios lubrificantes ou antialérgicos quando em crise são fundamentais para proteger a córnea. O uso intensivo de computador ou de vídeogrames não faz mal para o paciente mas a baixa freqüência do piscar durante estas atividades é prejudicial para a correta hidratação e oxigenação da córnea. A diminuição da freqüência do piscar está diretamente ligada a uma maior taxa de evaporação do filme lacrimal que recobre a córnea, causando o que é chamado de síndrome de olho seco evaporativo). Nestas situações é comum o paciente ficar com os olhos vermelhos ao final do dia e ter algum desconforto associado a secura ocular.


 
 "...a baixa freqüência do piscar quando nestas atividades é prejudicial para a correta hidratação e oxigenação da córnea."


 Com a sensação de secura vem a necessidade de esfregar ou coçar os olhos e isso é um agravante na progressão da patologia do ceratocone. Em tempos onde o uso intensivo do computador, aliado ao uso de ar condicionado (que diminui sensivelmente a umidade do ar no ambiente) em casa, no escritório, no carro ou também do uso de calefação ou aquecedores de ambiente nas épocas frias (mais no sul do país) há uma exponencial probabilidade de sentir a necessidade de coçar os olhos em virtude da sensação de secura da mucosa ocular. O ato de coçar os olhos é frequentemente mencionado em praticamente todos os estudos sobre a origem do ceratocone, inclusive naqueles que atribuem a uma questão genética. De fato existem gatilhos de diferentes tipos (no caso genético pouco se sabe ainda) que podem contribuir para o surgimento da patologia. Quando o paciente coça com freqüência e com muita força os olhos ele enfraquece as fibras de colágeno corneano responsáveis pela resistência biomecânica da córnea, é como desgastar um tecido como o brim para deixá-lo mais macio e flexível. A córnea com uma resistância biomecânica menor ficará mais suceptível de afinar e gerar a área cônica na região afetada. 

Olhos irritados devido a infecção, reações alérgicas, o estresse emocional na puberdade ou na adolescência pode ser a causa de um aumento da coceira ocular. Isso pode ocorrer em qualquer pessoa e não ter maiores conseqüências, entretanto em uma córnea suceptívelmente enfraquecida por um processo inflamatório coincidente ou anterior pode ser o gatilho que faz com que o ceratocone geralmente se manifeste nessa idade. Observamos ao longo desta última década que o aumento do estresse emocional e a depressão ou tristeza profunda (perda de um familiar próximo, separação, etc) podem estar associados a episódios pontuais e significativos de progressão do ceratocone. Acredita-se que possivelmente os pacientes possam coçar mais os olhos nestes períodos. Também observamos ao longo das últimas décadas que as mulheres com ceratocone que engravidam apresentam episódios de progressão durante a gestação, possivelmente devido as mudanças hormonais pela qual ela passa em todo o corpo. 

"O ato de coçar os olhos é frequentemente mencionado em praticamente todos os estudos sobre a origem do ceratocone"


Uso de lubrificante ocular prescrito pelo oftalmologista.
A correta orientação para que o paciente com ceratocone diminua ou amenize o ato de de coçar os olhos é de fundamental importância e deve ser sempre lembrada pelo oftalmologista e pela equipe técnica de suporte da clínica. O paciente e seus familiares devem ser sempre informados desta questão pois as vezes o ato de coçar não é percebido como um risco para o agravamento do problema. Após a informação ser disposta as chances do paciente e familiares próximos que convivam com paciente de perceber mais quando isso ocorrer são maiores e podem ajudar no controle ao menos desse gatilho considerado tão importante. Vale lembrar que recentemente li um artigo falando sobre isso como se fosse uma descoberta atual em relação ao perigo de coçar os olhos com freqüência e força demasiada, mas existe relatos sobre esta questão desde os anos 60 do século passado. Em 1967, Dr. Frederick Ridley, oftalmologista do Moorfields Eye Hospital em Londres, escreveu para o comitê editorial do British Journal of Ophthalmology dizendo que já em 1947 observou um paciente com caso severo de ceratocone esfregando os olhos com muita força e isso lhe chamou a atenção. Em 1956 ele concluiu um estudo retrospectivo de 92 pacientes com ceratocone mas omitiu esta questão do ato de coçar os olhos pois não tinha até então certeza da validade científica da informação. No documento de 1967, Dr. Ridley afirma que com esta correspondência e que agora com uma casuística de mais de 300 casos ele entende que esta informação deva ser distribuida entre os oftalmologistas afim de alertar os pacientes sobre os perigos do ato de coçar os olhos para o agravamento da patologia do ceratocone. Esta informação está disponibilizada na comunidade científica oftalmológica há mais de 45 anos e seguramente não é nova. Meu pai (Dr. Saul Bastos) já comentava sobre isso desde quando eu era pequeno e eventualmente convivia com ele nas clínicas e hospitais onde ele trabalhou. 

"já em 1947 observou um paciente com caso severo 
de ceratocone esfregando os olhos com muita força 
e isso lhe chamou a atenção."

Outro fator a considerar é a existência de algum processo alérgico que possa induzir o paciente ao ato de coçar os olhos. Alguns pacientes apresentam rinite alérgica especialmente sazonal ou outros gatilhos (ver rinite alérgica - causas) e com alguma freqüência provocam a coceira ocular e estão associados ao ceratocone.Tendo tanto o oftalmologista o cuidado de observar estas questões, alertando pacientes e familiares, indicando outros especialistas de áreas relacionadas (alergista ou otorrinolaringologista) para tratar da questão de forma sistêmica, cabe agora o acompanhamento e a verificação de qual a melhor opção para o paciente. Com esta premissa, deve ser feita análise para identificar o que é o melhor e ideal para o paciente de acordo com a condição apresentada e com o devido acompanhamento.

Uma boa orientação para o paciente é orientar uma dieta equilibrada e saudável, incluir na dieta a ingestão de ômega 3 e ômega 6, óleo de semente de linhaça dourada (ou a linhaça pura mesmo) e chá branco ou chá verde pois estes são antioxidantes e contribuem para amenizar a ação dos radicais livres. O controle do estresse e prática de exercícios físicos também é benéfica para a saúde geral do paciente. A poluição, o fato de piscar com menor freqüência ou mesmo não piscar durante o uso de computador, podem contribuir para aumentar a irritabilidade dos olhos. É recomendável lavar o rosto e incluir as pálpebras com maior freqüência especialmente aqueles que moram em grande centros urbanos.

As opções de tratamento

O que mais perturbar o paciente com ceratocone é a baixa de visão, esta é sem dúvida a questão mais importante para o paciente. O oftalmologista precisa ser claro para o paciente e seus familiares que a opção de tratamento mais efetiva para a visão geralmente será a menos invasiva possível, geralmente os óculos em estágios iniciais e as lentes de contato especiais nos casos moderados até os mais avançados. Exceto nos casos iniciais da patologia, não existe tratamento cirúrgico que possibilite uma reabilitação visual de alta qualidade como a adaptação de lentes especiais, desde que sejam lentes boas, de alta qualidade e tecnologia, confortáveis, bem adaptadas e o paciente seja bem orientado quanto ao uso, limpeza e manuseio das mesmas.

Hidropsia corneana aguda

Nos casos de pacientes que tem episódios de hidropsia corneana a córnea fica com um aspecto de nébula esbranquiçada, geralmente no centro da córnea o que interrompe a passagem da luz e consequentemente decai ou mesmo bloqueia a visão. É importante mencionar que na maior parte dos casos a córnea irá clarear noivamente em algumas semanas ou mesmo meses, restando alguma cicatriz mas que em muitos casos não impede uma readaptação com lentes de contato rígidas gás permeáveis especiais que podem proporcionar uma acuidade visual satisfatória mesmo nos casos mais avançados e extremos. O uso de colírios a base de NaCl 5% por exemplo poderá ajudar a córnea a recuperar-se e retornar a sua transparência. Paciência é vital nestes casos pois podem ser necessários meses até a completa recuperação.

Lentes de Contato Especiais

Lente Ultracone adaptada em ceratocone avançado. A área
verde mostra a presença de lágrima entre a lente e a córnea.

A adaptação de lentes rígidas gás permeáveis especiais (RGP's) é largamente a técnica mais utilizada para a reabilitação visual dos pacientes com ceratocone. Mesmo nos casos onde o paciente submeteu-se a qualquer procedimento cirúrgico como implante de anel, crosslinking ou mesmo o transplante de córnea muitas vezes a adaptação de lentes de contato RGP será mandatória para a melhor reabilitação visual do paciente. Considerando que a córnea é um dos orgãos mais nobres do ser humano, a adaptação de lentes rígidas especiais, quando bem feita e com lente de boa qualidade é a que menos riscos oferece ao paciente, indiscutivelmente. É comum a dificuldade que pacientes com ceratocone enfrentam até encontrar uma clínica especializada e lentes de boa qualidade e tecnologia as quais eles possam se adaptar. Uma das mais frequentes queixas destes pacientes é a falta de conforto e as complicações causadas pela adaptação indevida ou com lentes de qualidade sofríveis. Outro fato é que alguns estados e cidades carecem de especialistas que sejam seriamente dedicados a adaptação de lentes especiais em córneas irregulares como o ceratocone. Possivelmente estes são alguns dos motivos pelos quais o IOSB recebe anualmente centenas de pacientes vindos de todo o Brasil. Alguns inclusive moram no exterior e regressam ao Brasil combinando a oportunidade de visitar suas famílias e para as revisões de rotina. 

O sucesso na adaptação de lentes especiais no ceratocone, mesmo pós-transplante de córnea é resultado de muito estudo, de desenvolvimento tecnológico e da disposição em resolver como for possível a cada caso. As lentes que são utilizadas no IOSB são fabricadas pela Ultralentes e no website existe uma aba Onde Encontrar na qual existe uma lista de oftalmologistas que é atualizada mensalmente para que os pacientes com ceratocone e outras patologias possam procurar um especialista próximo a sua cidade ou estado antes de pensar em vir ao IOSB como último recurso. Inclusive nos dias 14 e 15 de Dezembro o IOSB promoveu o Curso Avançado Saul Bastos de LC Especiais que foi um projeto piloto para futuras edições. O curso foi um sucesso e em breve novos especialistas estarão figurando entre os credenciados a adaptar as lentes fabricadas pela Ultralentes. Naturalmente que alguns podem imaginar que minha ligação com o IOSB e com o laboratório Ultralentes seja apenas uma forma de propaganda, mas os mais de 10 mil pacientes que forem tratados entre 1970 e 2012 são resultado de um trabalho profundo, com muito estudo e dedicação com foco no paciente e no que é melhor para ele. Fica ao menos a dica de que quem consultar qualquer um dos credenciados na Ultralentes tem a chance de fazer seu juízo pessoal, tem a chance de tentar quando outras alternativas falharam ou os resultados ficaram aquém das expecativas. 

É muito comum alguns dos pacientes que vem a Porto Alegre consultar no IOSB estarem já sem esperanças, estes são pacientes geralmente com dificuldades maiores mas o esforço que fazemos no sentido de resolver da melhor maneira possível e o mais rapidamente possível frequentemente é recompensado com a alegria que estes tem ao observarem os resultados. Quando o caso é ainda inicial lentes RGPs utilizadas para miopia e astigmatismos funcionam bem, mas em casos moderados a avançados é necessária a adaptação de lentes RGPs especiais para o ceratocone, em outros casos quando o caso é muito avançado ou extremo ainda há uma série de lentes chamada Ultracone Extreme. Outra tecnologia pioneira no IOSB e fabricada pela Ultralentes são as lentes semiesclerais SSB e esclerais SB. As lentes semiesclerais possuem diâmetros que vão em média de 16.0 a 17.5 mm. de diâmetro e as esclerais de 18.0 a 23.0 mm. Estas lentes foram desenvolvidas por mim a partir de 2007 (depois de 7 anos de estudo, pesquisa e orientação) quando iniciamos a produção dos primeiros protótipos e somente começaram a ser adaptadas por volta de 2008. As lentes esclerais possibilitam a resolução de casos de altíssima complexidade onde mesmo todas as demais lentes não apresentavam um resultado satisfatório ou o sucesso era parcial. 


Lente Scleral Bastos, cortesia IOSB



"As lentes esclerais possibilitam a resolução de casos de altíssima complexidade"




O mais importante nas lentes de contato, seja qual forem, elas é que poderão proporcionar a melhor acuidade visual possível de se obter ou seja, se não houver outro problema que impeça a visão como opacidades corneanas. Lembrar que lentes de má qualidade e/ou incorretamente adaptadas podem proporcionar lesões irreversíveis (cicatrizes, nébula ou leucoma) e se a visão não puder ser restabelecida com lentes somente o transplante poderá trazer a transparência corneana novamente. Seja qual for o procedimento cirúrgico que o paciente se submete, se houver a necessidade de correção visual que o óculos não proporciona, as lentes voltam como agente principal na reabilitação visual destes pacientes.


Crosslinking

Para haver indicação segura de crosslinking a córnea deverá ter no mínimo 400 micras de espessura no ponto mais fino e preferencialmente o paciente não deve apresentar sinais de olho seco que podem agravar com o procedimento. Nos casos bem indicados onde existe a constatação inequívoca de progressão, há a possibilidade do tratamento por crosslinking (CXL) que consiste na remoção da porção central do epitélio corneano, instilar um colírio de riboflavina por cerca de 30 minutos e sob a ação de um raio ultravioleta controlado. Este procedimento já comprovado por diversos estudos desde o início da década passada fortalece as ligações covalente de fibras de colágeno, enrigecendo a córnea e evitando a sua progressão em mais de 70% dos casos. Embora não existam casos com seguimento de 15, 20 ou mais anos ainda o procedimento tem demonstrado ser bastante ficaz até então. Cabe no entanto informar que o procedimento do CXL sozinho não tem a finalidade e nem pretende proporcionar uma melhora na acuidade visual do paciente e sim não deixar progredir a patologia piorando ainda mais a visão. O pós-operatório geralmente provoca dor forte no olho tratado e o paciente deverá fazer uso de analgésicos para passar este desconforto inicial. Outro efeito do procedimento é que a visão do paciente poderá ficar "leitosa" (chamada de haze corneano) durante algumas semanas ou meses mas ela voltará a ficar mais clara com o tempo.

Para a reabilitação visual destes pacientes, caso a prescrição de óculos não seja satisfatória, será necessária a adaptação de lentes de contato especiais. Atualmente existem diversas opções de lentes no mercado as quais poderão proporcionar a adaptação desejada. É importante lembrar que se o paciente não se adapta a uma determinada lente ele deve procurar por outras opções, é bastante provável que ele embora não tenha sucesso com as primeiras possa descobrir uma a qual ele irá se adaptar melhor com conforto, boa visão e mantendo a saúde fisiológica da córnea. Existem inúmeras lentes para ceratocone de diferentes fabricantes, as vezes é uma questão de sorte ou em outros casos o paciente terá que tentar diferentes lentes possivelmente em clínicas diferentes para encontrar uma que seja possível uma boa adaptação.


Implante de anel intraestromal

O implante de anel foi inicialmente desenvolvido por Barraquier para o tratamento da miopia. O implante de anel a sua aplicação inicial no ceratocone teve propósito de deter o avanço da progressão. Com o desenvolvimento da técnica de forma pioneira no Brasil pelo Dr. Paulo Ferrara e, posteriormente produzido por outros fabricantes, os anéis também passaram a ser utilizados como forma de melhorar a acuidade visual dos pacientes, especialmente os casos iniciais e moderados. Embora existam relatos de pacientes com ceratocone que tiveram sucesso na reabilitação visual com o implante, é comum ver relatos de pacientes que fizeram com este propósito mas que obtiveram resultados insatisfatórios e abaixo de suas expectativas. É provável que como o ceratocone é uma patologia bastante singular e individual para cada caso, a imprevisibilidade dos resultados seja uma das questões que produzam este menor índice de sucesso. Outro fator a ser considerado é a curva de experiência do cirurgião, pois quanto maior pode produzir um resultado melhor. Hoje existe a possibilidade de fazer os dutos onde são inseridos os segmentos do anel por laser (femtosecond laser) que faz com extrema precisão, mas ainda assim a imprevisibilidade dos resultados existe pois a córnea é muito sensível e pode responder de maneira diferente a força que é aplicada pelos segmentos. É inegável o benefício que a técnica proporciona nos casos onde bons resultados foram obtidos, há relatos de bons resultados nas comunidades mas não é a regra. Alguns eventualmente tem queixa de ver reflexos dos segmentos durante a noite quando a pupila dilata, novas técnicas e anéis menor visíveis foram desenvolvidos para atenuar estas questões. Há também relatos de piora da visão e de complicações como a extrusão de um dos segmentos que teve que ser cirurgicamente removido. 

Boa parte dos casos de ceratocone onde houve o implante de anel intraestromal tem que fazer adaptação de lentes de contato. Pelo histórico de relatos tanto de especialistas em adaptação de lentes de contato como nas comunidades de ceratocone no Brasil e no exterior as dificuldades de adaptação de lentes de contato geralmente são maiores em paciente com implante de anel. Muitos oftalmologistas lançam mão de uma técnica de utilização de lentes gelatinosa por baixo da rígida (técnica chamada piggyback) para proporcionar maior conforto e segurança ao paciente mas geralmente esta técnica funciona por alguns meses até poucos anos e o paciente acaba desenvolvendo intolerância alérgica ao uso deste sistema, possivelmente por hipoxia corneana.

Embora uma das condirações feitas pelos cirurgiões de que a técnica é reversível, cabe lembrar que remoção ou troca dos segmentos implica em um novo procedimento com custo similar ao da cirurgia, que envolve os honorários do cirurgião, anestesista, etc. Outro fator a considerar é que o procedimento embora seja dito irreversível não garante que a córnea irá retornar ao estado anterior, pelo fato de haver dutos que foram criados para inserção do anel são feitos cortes nas fibras de colágeno corneano em uma córnea que já claramente apresenta um enfraquecimento de sua resistência biomecânica.


Transplante de córnea

Transplante de córnea.
No passado as únicas possibilidades para os pacientes de ceratocone eram a adaptação de lentes especiais e o transplante de córnea como último recurso sempre. A cirurgia evoluiu muito nas últimas décadas com novos métodos (não é o propósito aqui discutir tais técnicas) que vão desde a técnica tradicional manual, passa pelo transplante lamelar (que retira parte da córnea anterior ou posterior) e também pela técnica do femtosecond laser que produz córneas receptoras e botões de córneas doadas mais precisos e com melhor encaixe, resultando em uma recuperação mais rápida e com melhor resultado final. Embora as técnicas tenham sido aperfeiçoadas é natural que os resultados sejam de pouca previsibilidade, embora o cirurgião ao retirar eventualmente os pontos nas visitas de retorno procure assegurar que a córnea apresente o menor astigmatismo irregular possível. É impossível controlar todas as variáveis envolvidas na cicatrização e na acomodação do botão doado junto a córnea receptora. Através das topografias de córnea o especialista procura manter ou soltar pontos com a finalidade de proporcionar a melhor regularização da superfície corneana possível.

Outras questões a serem consideradas: 
  • Idade do paciente: Quanto mais jovem mais ele sofrerá com a perda de correção visual durante o pós-operatório caso ele use lente de contat com boa visão (ou aceitável visão) neste olho. 
  • A possibilidade de um processo de rejeição: O estigma da rejeição é uma constante, naturalmente que o passar do tempo as chances desse tipo de ocorrência diminue mas se ocorrer as vezes um novo transplante tem que ser feito.
  •  A sobrevida da córnea doada: Se o paciente for jovem e a córnea doada for de uma pessoa que era de mais idade há a possibilidade de que após uma ou duas décadas ocorra uma falência das células endoteliais, o que irá diminuir a transparência da córnea, quando isso ocorre um novo transplante será necessário. 
  • Readaptação ou adaptação de lentes especiais:  Se necessário, e em grande parte é, o paciente terá que submeter-se a nova adaptação de lentes de contato especiais após a recuperação que pode levar entre 8 a 18 meses dependendo da técnica utilizada. Caso o objetivo do transplante de córnea for livrar-se de lentes de contato talvez seja interessante primeiro considerar a procura por lentes melhores se for possível e acessível para o paciente.

Outras alternativas

É interessante lembrar, como já foi postado anteriormente neste blog, que alguns oftalmologistas cirurgiões tem uma linha de raciocínio diferente em relação aos tratamentos cirúrgicos oferecidos. Na era do "remodelamento corneano" que surgiu a partir do chamado Protocolo de Atenas, são adeptos das combinações de técnicas cirúrgicas, simultâneas ou sequenciais com a finalidade de remodelar a córnea e obter assim uma melhor regularização da superfície anterior da córnea. Alguns exemplos (e não pretendo me aprofundar muito nesta área) são: a combinação de implante de anel e crosslinking, cirurgia refrativa e crosslinking e até mesmo as três técnicas combinadas. As variações quanto a qual a melhor combinação ainda é uma incógnita e não existe de fato um protolo de estudo (salvo se houver algum estudo sendo conduzido nesse sentido e ainda não publicado) e mesmo assim ainda irá demorar até que estudos similiares sejam publicados e comparados. A córnea com ceratocone já é uma córnea frágil, com menor volume de tecido estromal e portanto mais fraca para receber tamanha agressão de diferentes procedimentos, especialmente quando o excimer laser é envolvido (equipamento para cirurgia de miopia/astigmtismo/hipermetropia) pois sempre que o laser entra em ação ele irá retirar (queimar) mais tecido durante a ablação.

Na oftalmologia atual, em especial no Brasil, há basicamente três tendências que são levemente intercambiáveis. A primeira linha de tendência é o oftalmologista mais conservador e que acredita que deva-se preservar a córnea de qualquer agressão, priorizando sempre a adaptação de lentes de boa qualidade e alta tecnologia no lugar de um procedimento mais invasivo. Outra linha é de oftalmologistas conservadores mas também cirurgões que entendem que em certos casos o implante de anel ou o crosslinking podem ser bem indicados e mesmo assim estão ou consideram-se aptos a readaptar o paciente com lentes especiais após o procedimento. A terceira tendência seria a dos cirurgiões, não adaptadores de lentes de contato que não dedicam-se a esta sub-especialidade e que já vêem o paciente com ceratocone imaginando qual seria o procedimento cirúrgico mais adequado. 

Interessante que durante alguns congressos de oftalmologia gosto muito de assistir os cirurgiões apresentarem e discutirem casos de ceratocone (especialmente quando as aulas de lentes de contato estão fracas). É sempre supreendente a maneira como eles vêem a córnea e o ceratocone, eles sempre estudam a córnea de maneira mais microscópica que os conservadores. Já os chamados conservadores estudam os métodos menos invasivos possíveis para oferecer segurança e a melhor acuidade e qualidade de visão ao paciente. Já mencionei isso para diversos amigos oftalmologistas, das três linhas de tendências, que existe uma lacuna muito grande em relação ao conhecimento específico do objeto de estudo da linha 1 e a linha 3 principalmente. Naturalmente é difícil atingir um consenso quando a corrente fislosófica entre as partes são substancialmente distintas mas é através do aprendizado e do conhecimento da outra parte que pode haver um crescimento. Como é possível obter-se consenso quando as diferentes linhas filosóficas buscam solucionar os problemas enfrentados pelos pacientes de acordo com suas próprias convicções?  Na minha opinião há espaço para todos os estudos no sentido de oferecer opções de tratamento aos pacientes, desde que o objetivo seja o melhor para o paciente sempre e isso remete diretamente a questão da segurança do paciente, da saúde fisiológica corneana. Quanto menos invasivo, menor será a agressão. No entanto a linha de raciocínio do cirurgião é a de apostar no remodelamento corneano e que a córnea responderá bem aos métodos aplicados mas não garante (até porque não dispõe de estudos de longo prazo para isso) a segurança a longo prazo e nem mesmo pode garantir a manutenção do resultado obtido. Novamente alerto para que nenhum procedimento por mais teoricamente comprovável que seja, irá sobrepor ao resultado final da visão proporcionada pela lente de contato especial bem adaptada. Os cirurgiões tendem a ver a adaptação de lentes de contato como impossível de ser obtida em certos casos de ceratocone ou estão predispostos a visão que tem ao atender pacientes que desistiram de lentes por falta de adaptação mas que infelizmente não tiveram a persistência ou a sorte de encontrar uma solução adequada em lentes de contato especiais.

Tanto a lente de contato como os procedimentos cirúrgicos disponíveis não conseguem alterar a superfície posterior (dentro da córnea), entretanto em relação a superfície anterior a lente de contato e a lágrima do paciente podem neutralizar em todo ou em grande parte o astigmatismo irregular elevado encontrado nestes casos. O contraponto é que se o método cirúrgico tornar a córnea mais regular em sua superfície talvez isso viesse a facilitar a adaptação de uma lente de contato. O problema é o custo (não se trata de custo da cirurgia em si) que a córnea vai pagar, especialmente a longo prazo. Eu espero que estudos sobre estas técnicas de diferentes interpretações comecem a ser divulgadas nos próximos anos, ao menos assim quem saiba tenhamos então um parâmetro para comparação entre custo x benefício destes procedimentos e mesmo a posterior adaptação de lentes de contato. Eu escrevi há poucos anos atrás sobre uma teoria de utilizar uma lente de contato rígida como forma de colaborar na regularização da superfície, foi baseado em outros estudos separados sobre cirurgia refrativa, ortoceratologia e crosslinking, está publicado no fórum Ultralentes com o título Controlled Orthokeratology combined with CXL.


Conclusão

Em termos de reabilitação visual a lente de contato especial é sem dúvida a que melhor atenderá as expecativas do paciente nesta importante questão que é a visão e é o que o paciente mais sente necessidade. Atualmente com as tecnologias em lentes especiais como as desenvolvidas pela Ultralentes, assim como as lentes esclerais modernas proporcionam esta possibilidade com ótimos resultados em termos de visão e podem ser adaptadas mesmo nos casos mais extremos onde o ceratocone ultrapassa 100 dioptrias nos mapas ceratométricos simulados obtidos na tomografia de segmento anterior. Deve ser a primeira opção em termos de custo x benefício e incorporando a questão da segurança fisiológica da córnea. Muitos especialistas, tanto cirurgiões como os que não tratam ceratocone e mesmo aqueles que adaptam lentes desconhecem estas possibilidades e as frequentemente indicam precocemente o transplante de córnea ou algum dos outros métodos cirúrgicos até mesmo por esconhecer a sua indicação e aplicação.

A classe oftalmológica deve, seja  o especialista cirurgião de córnea ou adaptador profissional de LC especiais, interagir mais para que o resultado das somas de experiências e estudos possam resultar em quem sabe técnicas cirúrgicas e de adaptação de lentes ainda mais seguras e mais completas.

Um Feliz 2013 e muita saúde e visão para todos!

Luciano Bastos
Em colaboração com o Blog C&T.