Com o advento da topografia corneana o diagnótico mais preciso do ceratocone tem demonstrado que a patologia aumenta conforme a razão do aumento da população. Embora as estatísticas apontem em média um caso para cada duas mil pessoas em certas regiões, por motivos ainda desconhecidos pode ser maior ou menor. Antigamente muitos casos de pacientes que iniciaram usando óculos e diagnosticados com astigmatismo corneano eram na verdade um caso de ceratocone inicial difícil de diagnosticar, mas o tratamento juntamente com ou logo em seguida foi e tem sido na grande maioria das vezes a adaptação de lentes de contato especiais, e isso vale para outros países do primeiro mundo.
Qual o melhor tratamento?
Esta é uma pergunta frequente para aquelas pessoas diagnosticadas com ceratocone, inclusive de seus familiares que solidários ao ente querido buscam as vezes de maneira incansável maiores informações sobre esta patologia. É comum nas consultas com o oftalmologista pacientes irem acompanhados de um ou mais familiares (as vezes quase a família inteira) dada a importância fundamental que a visão tem na qualidade de vida destas pessoas. O impacto negativo que uma visão baixa causa nelas, dificultando o estudo, o trabalho, as relações sociais e as vezes até mesmo colocando o paciente em situações de risco.
Fig. 1: Ex. de mapa topográfico de ceratocone. |
Esta situação acima ocorre após o paciente ter recebido o diagnóstico e somente terá alteração neste quadro quando o paciente tiver uma perspectiva de tratamento, uma esperança que sempre é dividida e anciosamente esperada pela família, sempre solidária. Em alguns casos estes pacientes terão de procurar diversos especialistas pois como atualmente a oftalmologia divide-se em uma enorme gama de subespecialidades muitas vezes um profissional, pode ser um excelente médico oftalmologista, mas sua subespecialidade é por exemplo, catarata, glaucoma, cirurgia refrativa, vias lacrimais, etc. Normalmente este médico irá indicar um conhecido que tem na sua prática o tratamento do ceratocone, seja por meios invasivos (cirúrgicos) ou por reabilitação visual com o uso de lentes especiais.
A resposta
A pergunta do título acima é fácil, direta e sugere uma resposta no mesmo estilo, direta e definitiva, entretanto esta resposta não é fácil, não é direta e é de fato de importante complexidade. Em primeiro lugar o paciente precisa ser examinado, fazer exames como topografia e/ou tomografia de córnea tem importante valor na interpretação do caso, consiste também em verificar a acuidade visual do paciente com correção e sem correção, primeiro se tenta os óculos que nestes caso são geralmente difíceis de obter um bom resultado e para isso é necessário um tempoo maior de exame e tentativas de obter uma refração clínica com precisão, geralmente com eixos de astigmatismo oblíquos e elevados. Alguns pacientes serão beneficiados com esta tentativa e a recomendação pelo protocolo de tratamento do ceratocone é de observar o paciente de seis em seis meses ou uma vez ao ano pelo menos para saber se está havendo evolução do caso ou não. Uma recomendação básica que está presente em praticamente todos os estudos do ceratocone publicados é a de não coçar os olhos pois o ato de coçar os olhos está associado diretamente a progressão do ceratocone. Neste caso o médico deve investigar a origem e como se apresenta o quadro de coceira ocular e determinar o tratamento para aliviar o sintoma.
É temerário indicar um tratamento como implante de anel ou crosslinking antes de observar o comportamento da ectasia, o ideal é orientar o paciente primeiro e se os óculos não proporcionarem uma acuidade visual satisfatória a adaptação de lentes especiais deve ser a opção de tratamento seguinte pois uma adaptação bem sucedida pode mudar a vida do paciente sem a necessidade de submeter-se a um tratamento no qual não se pode presumir com exatidão com o resultado que será obtído. Embora tenham surgido nas últimas décadas novos tratamentos para o ceratocone, desde o implante de anel intracorneano, o crosslinking de colágeno de córnea com riboflavina sob luz ultravioleta, novas técnicas de transplante manuais e pelo femtosecond laser, os resultados nem sempre são aqueles esperados pelo paciente e por conseqüência pelos familiares, um bom especialista e cirurgião deve selecionar bem os casos para uma melhor indicação onde é possível ao menos presumir que haverá uma melhora da acuidade e/ou da qualidade visual do paciente. Existem muitos depoimentos de pacientes que submeteram-se a estes procedimentos e que afirmam ter solucionado o seu caso, entretanto os depoimentos geralmente também mencionam esperarem mais do procedimento e muitos ainda requerem correção óptica para uma acuidade visual satisfatória e mesmo assim nem sempre os óculos irão resolver.
O importante papel das lentes de contato especiais
O mais interessante de tudo é que sempre a adaptação de lentes de contato rígidas (gás permeáveis) especiais ou mais recentemente lentes esclerais é a técnica que oferece a melhor resposta em termos de acuidade e qualidade visual para estes pacientes. Naturalmente que para que a adaptação seja de fato bem sucedida é necessário que esta melhor visão seja acompanhada com uma boa adaptação de parte do paciente, com conforto progressivo e assegurando a saúde fisiológica da córnea, do limbo e da esclera.
Felizmente no Brasil temos excelentes fabricantes de lentes, e embora nem todos os especialistas tenham todas as lentes de todos os fabricantes há uma diversidade grande de possibilidades. O que se observa é que estes pacientes as vezes, quando possível, viajam para outros estados em busca de soluções pois praticamente esgotaram as possibilidades e tentativas de adaptação. A adaptação de lentes especiais em casos de ceratocone, seja pós-implante de anel ou mesmo pós-transplante de córnea (transplantados com córneas irregulares), de degeneração marginal pelúcida, ceratoglobo, córneas pós-cirúrgicas é muitas vezes de altíssima complexidade, exigindo tempo maior de exames e testes com o paciente e também de ter um bom pessoal de apoio (auxiliares) para atender as necessidades de cada caso.
Há uma carência de especialistas que tenham maior experiência e conhecimento na adaptação de lentes de contato, especialmente devido a enorme quantidade de subespecialidades da oftalmologia que surgiram nas últimas décadas. Os congressos e simpósios de oftalmologia muitas vezes (quando o tema envolve segmento anterior e córnea) abordam a adaptação de lentes de contato especiais, no entanto dada a complexidade do assunto, dada as restrições de tempo (estes eventos abordam uma grande quantidade de outros assuntos, inclusive de lentes gelatinosas), dado o fato de que muitas vezes o oftalmologista tem que optar entre uma aula de adaptação de lentes e outra de cirurgia, grande parte dará preferência a cirurgia, isso infelizmente ocorre e não é falta de interesse do especialista, apenas ele tem que fazer uma opção e o interesse dele maior naquele momento pode ser aquela outra aula. Outro fator a ser levado em consideração é a de que temos hoje no Brasil uma quantidade exagerada de congressos de subespecialidades, tanto é que se olharmos o calendário oftalmológico veremos que há eventos em praticamente todos os meses do ano, alguns inclusive ocorrem nos mesmos meses, as vezes com dias de diferença. Enquanto não houver uma iniciativa por parte das entidades oficiais de rever esta questão e de propor uma mudança os especialistas tem que decidir ao longo do ano em quais os eventos eles irão. E esta decisão muitas vezes passa em primeiro lugar pelo assunto ou tema principal que será tratado neste ou naquele evento e muitas vezes a necessidade do profissional é de aprimorar-se ou reciclar-se em outra matéria que não seja a adaptação de lentes de contato especiais em córneas irregulares como o ceratocone, embora este esteja se tornando um tema importante nos últimos anos graças a iniciativa de algumas entidades ligadas ao tema.
Finalmente a resposta para a pergunta acima não é defintiva e muit menos simples, mas uma coisa podemos ter certeza, a técnica que melhor atende as necessidades de reintegrar o paciente de ceratocone a suas atividades é a adaptação de lentes de contato especiais. É importante que os oftalmologistas engajados nesta subespecialidade possam aprimorar seu conhecimento, desenvolver novas aptidões e conhecer outras técnicas e tecnologias, isso me leva a adicionar este texto abaixo.
O Curso Avançado Saul Bastos de LC Especiais
Foi com este pensamento que há cerca de um ano e meio atrás, iniciei o planejamento de um curso especializado na adaptação de lentes de contato especiais, elaborei o plano, conversei e me aconselhei com amigos oftalmologistas e expoentes na adaptação de lentes de contato especiais para compormos um curso avançado nesta área, um curso focado na adaptação de casos de córneas irregulares como o ceratocone e outros casos igualmente de alta complexidade. O curso teve sua maturação, teve aprimoramentos no programa e no formato para que proporcionasse aos oftalmologistas participantes a oportunidade não só de assistir aulas específicas de como adaptar, personalizar e aprimorar suas adaptações mas também de levar casos para discussão, em cada sessão do programa há um amplo espaço de tempo para discussão onde é livre para palestrantes, debatedores e participantes trocarem informações, idéias e fazer perguntas. O nome do curso (Curso Avançado Saul Bastos de Lentes de Contato Especiais) é uma homenagem a meu pai, Dr. Saul Bastos, um dos oftalmologistas pioneiros na reabilitação visual através da adaptação de lentes de contato especiais desde 1969-1970.
SALUS AEGROTI SUPREMA LEX |
O curso tem enfoque absolutamente científico, vários temas afins serão tratados e os palestrantes terão toda a liberdade de manifestar a sua opinião, apresentar tecnologias de diferentes laboratórios e das técnicas por eles utilizadas. Embora tenhamos concebido o curso para ocorrer sem a necessidade de patrocínios, está aberta a possibilidade de patrocínios e a presença de expositores de empresas interessadas em participar, basta contatar pelo email contato@cursosaulbastos.com.br
Os oftalmologistas participantes sairão com uma carga de informações nunca antes vista em nenhum outro evento sobre o tema. Muitos pacientes de ceratocone, entre outros, terão benefícios diretos das novas possibilidades que se abrem para estes profissionais que vem de vários estados do Basil.
Muito obrigado a todos que lêem este blog pelas suas manifestações, pelos elogios e pelas suas participações. Este blog foi criado com a finalidade de trazer um pouco de conforto e como costumo dizer uma luz no fim-do-túnel.
Luciano Bastos
Em colaboração com o Blog C&T.
Ps. Evitei em meus comentários abordar a questão do SUS e da saúde pública pois este tema iria tornar o texto cansativamente longo. Apenas digo que sou solidário com os médicos e prestadores de serviços de saúde do Brasil que muitas vezes trabalham em condições precárias, sem material adequado e na maior parte das vezes com salários muito baixos.
Um comentário:
Oi Dr. Luciano. Parabéns por essa publicação.Considero uma grande vitória para toda a humanidade a dedicação e o sacrifício de alguns médicos especialistas, em todos os campos, que se lançam de corpo e alma ás pesquisas na busca da mitigação ou mesmo cura de doenças graves, como por exemplo o ceratocone. Moro na Amazônia, Belém do Pará, e tenho um filho de onze anos, David, que é portador de tal.
Somente a cerca um ano e meio atrás ele assim foi diagnosticado. Infelizmente, essa doença ainda muito desconhecida. Na minha opinião cidadã, dever-se-ia fazer uma grande campanha de utilidade pública, para levar melhores esclarecimentos á população através das mídias, por parte das autoridades responsáveis, envolvendo outros setores civis organizados.
No caso do David, lamentavelmente, ouve uma demora muito prejudicial quanto a determinação deste diagnóstico: primeiro por conta da nossa própria ignorância, depois devido a falta de melhor preparo de alguns oftalmologistas aqui da nossa terra que, emitiam opiniões abissalmente equivocadas, a ponto de termos chegado a nos preparar para operá-lo de catarata, caso tivessemos considerado a última consulta realizada com uma especialista.
Inspirados por Deus,resolvemos fazer um exame final antes de autorizar este procedimento,o que foi uma sorte pois,caso contrário, os danos e as consequências teriam sido catastróficas e irreversíveis, já que, no caso do menino David, tratava-se de ceratocone.
Devemos ao médico e professor catedrático Edmundo Almeida, responsável pelo setor oftalmológico do Hospital Universitário Bettina Ferro da UFPA, o acerto do diagnóstico. Como a doença já havia progredido ao ponto de anular 98% a visão do olho direito, e avançava velozmente para aquelo que ainda restava-lhe no olho esquerdo, onde o uso de lentes rígidas já não funcionavam, o pequeno David foi submetido a um Crosslink no excelente Hospital Público de Olhos de Sorocaba, a trinta dias passados.
O resultado desse capitulo bastante decisivo foi um sucesso e ele esta muito bem. Grosseiramente falando, numa escala de 1 a 10, conseguiu recuperar 9,5 da visão que possuía antes, sendo que, este 'cincozinho', segundo ele, fazem falta; mas, o procedimento deteve uma tendencia de cegueira para qual marchava, que só poderia ser resolvida com um transplante, cirurgia esta que, no momento, esta descartada pela equipe médica que o atende, por considerarem existir um risco muito alto de rejeição em razão da sua pouca idade, estando projetada para quando ele completar 16 anos.
Estamos aguardando os novos passos da evolução da medicina em nível de lançamento e aperfeiçoamento de novas lentes rígidas de última geração, na esperança de otimizarmos a acuidade visual de David. Acreditamos também - por estar associado á um todo - ser importante um melhor nivelamento, entrosamento e intercâmbio entre os diversos especialistas que trabalham nos campos específicos e avançados da oftalmologia, que dispersam seus conhecimentos num 'tsunami' de eventos, congressos, conclaves etc, quando deveriam criar um calendário nacional enxuto, articulado aos principais que acontecem no exterior.
Obrigado pelo espaço e, que Deus os inspire sempre.
Eduardo Bueres - Belém do Pará
edubueres@gmail.com
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