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domingo, 1 de janeiro de 2012

100 Anos de Pesquisa em Ceratocone

A primeira referência ao ceratocone foi feita em 1748 em uma dissertação de doutorado pelo oculista alemão Burchard Mauchard. A condição de ceratoconefoi então descrita e distinguida de outras patologias em 1854 pelo médico John Nottingham que cunhou o termo  córnea cônica. A patologia adquiriu seu presente termo em 1869 com a publicação de uma tese entitulada “Sobre o tratamento para o ceratocone” pelo oftalmologista Suiço Johann Horner.
A era “moderna” da correção do ceratocone começou em 1888 quando o oftalmologista Francês Eugene Kalt iniciou trabalhos  em uma concha de vidro bruta desenhada para comprimir o ápice da área cônica e assim corrigindo a distorção. Esta foi a primeira aplicação conhecida de uso de lente de contato para a correção do ceratocone.
Hoje sabemos que o ceratocone ocorre tanto em homens e mulheres de todas as etnias e em qualquer país do mundo. Embora números definitivos sejam difíceis de determinar, muitos especialistas concordam que nos Estados Unidos aproximadamente 1 pessoa em cada 2 mil possui ceratocone. Embora a causa exata do ceratocone permaneça desconhecida, os efeitos ópticos da patologia tem sido trabalhado com uso de óculos e lentes de contato de alta tecnologia.
Não há evidências para apoiar a teoria de que o uso de lentes de contato desde o início do ceratocone seja de efeito terapêutico para deter ou amenizar a sua evolução. Embora na nossa experiência no IOSB de mais de 40 anos de reabilaitação visual com lentes de contato observe-se que há claramente uma relação entre o uso de lentes de contato de boa qualidade e bem adaptadas com um número bastante baixo de indicações de transplante de córnea, ou seja, quando comparados os indivíduos que usam lentes bem adaptadas com aqueles que não utilizaram os episódios de progressão foram maiores no grupo que não usou lentes, salvo exceções.
O protocolo de tratamento do ceratocone, que visa primeiramente restabelecer a melhor acuidade visual possível de se obter, sugere atualmente que o ceratocone seja observado em intervalos que variam entre a cada 3-4 meses, a cada seis meses ou a cada 12 meses dependendo da idade do paciente, do conhecimento do caso por parte do especialista e especialmente pela resposta que o mesmo apresenta ao método de correção visual ou terapêutico aplicado.
A primeira opção no diagnóstico inicial e enquanto for possível é a prescrição de óculos, é o padrão em todo o mundo. Com uma prescrição bem feita o paciente poderá em muitos casos ter uma vida normal, pois a miopia e o astigmatismo resultantes da irregularidade provocada pelo ceratocone estão sendo corrigidas se não em sua totalidade, mas ao menos em grande parte. Ao mesmo tempo a adaptação de lentes de contato tem indicação relativa no início (como opção aos óculos) e posteriormente tem indicação por necessidade quando os óculos não mais proporcionam uma acuidade visual satisfatória.

Acompanhamento da evolução da patologia
Com o acompanhamento, tanto o oftalmologista como o paciente pode observar se houve alguma deterioração da qualidade e da acuidade visual que é um indicativo de que o ceratocone teve episódio de progressão nesse tempo.  A topografia de córnea tem sido utilizada especialmente nesta última década como meio de controle. O montante da progressão irá determinar se há de fato indicação para um tratamento cirúrgico menos invasivo como crosslinking ou implante de anel intracorneano com a principal finalidade de deter possíveis novos episódios de progressão. Geralmente pequenas alterações  nos exames topográficos e na ceratometria (Ceratômetro, Auto-Refrator-Ceratômetro, Topógrafo Corneano e Tomógrafo Corneano) não devem ser levadas em consideração para a indicação absoluta de procedimentos cirúrgicos, salvo se o paciente tem apresentado sinais claros de que a visão teve uma piora significativa. É igualmente importante distinguir se esta piora visual sem alteração significativa nos exames não é um sinal de uso inadequado de lente de contato de má qualidade ou de lente mal-adaptada.  

Na medida em que o paciente ultrapassa a fase do diagnóstico inicial ele geralmente experimentará alguns episódios de progressão. Estes episódios poderão ser mais brandos em pacientes bem orientados a utilizar colírios lubrificantes em forma de lágrimas artificiais para recompor o filme lacrimal que muitas vezes é alterado nos pacientes com ceratocone. A orientação de evitar coçar os olhos e tratar de alergias que levem a coceira ocular tem grande impacto preventivo para diminuir as chances de episódios de progressão freqüentes.  Nesta fase que compreende dos 17-19 aos 23-25 anos é que os riscos de episódios de progressão são maiores.
A partir dos 25 anos, o paciente de ceratocone geralmente passa a ter episódios de progressão menos freqüentes ou mais raros, isso deve-se provavelmente ao fato de que o mesmo atravessou a fase de desenvolvimento do corpo e da atuação dos hormônios de crescimento com a chegada da idade adulta. Muitos especialistas afirmam que o ceratocone costuma estabilizar a partir entre os 30 aos 40 anos do indivíduo, embora seja de conhecimento que alguns casos continuam a progredir mesmo até após esta idade, em menor velocidade mas são casos que talvez tenham a indicação de transplante de córnea, estes são menos de 10% dos casos de ceratocone.
Nenhum outro grupo beneficiou-se tanto com a evolução na ciência de lentes de contato como os portadores de ceratocone.  Lentes de alta oxigenação, novos desenhos de boa qualidade, adaptadas de forma personalizada e por profissionais experientes possibilitam uma visão incomparável com qualquer outro meio de correção ou de tratamento cirúrgico do ceratocone. Alguns casos (não necessariamente avançados) têm uma maior complexidade de adaptação e podem requerer maior tempo de testes e de estudo para determinar a melhor alternativa, porém os resultados obtidos geralmente compensam os esforços do médico e do paciente.

A história das lentes de contato no ceratocone
As lentes de contato iniciaram com as grandes lentes esclerais de 18 mm. a 24 mm de diâmetro feitas em vidro no final do século 19. Posteriormente entre 1930 e 1940 o vidro foi substituído por um molde sintético feito chamado polimetilmetacrilato (PMMA). Este material representou um grande avanço para a fabricação das lentes esclerais pelo fato de ser mais macio que o vidro, porém devido a não possuir permeabilidade ao oxigênio a utilização destas lentes limitava-se a um período de 4 a 6 horas, depois disso começava a apresentar edema de córnea.
Nos anos 50 as lentes esclerais deram lugar a pequenas lentes de contato chamadas lentes de contato corneanas (de 7.5 mm a 8.5 mm. de diâmetro), eram lentes rígidas fabricadas no material PMMA e por possibilitarem a troca lacrimal entre a lente e a córnea possibilitaram extender o uso para entre 8 a 12 horas dependendo do seu tamanho. Quanto menor ela fosse maior o tempo de uso devido a uma menor área de cobertura da lente sobre a córnea. Com o tempo estas lentes foram aumentando de tamanho pois isso oferecia uma adaptação mais estável, entretanto o edema de córnea continuava a ser um problema ser superado.
Dois avanços dramáticos na tecnologia de lentes de contato possibilitaram aumentar os diâmetros das lentes corneanas, sendo a introdução em 1979 do material gás permeável (RGPs) e de avanços nas técnicas de fabricação destas lentes com desenhos de maior complexidade geométrica. Novos equipamentos e técnicas de fabricação possibilitaram fabricar lentes com diversas curvaturas. Uma das mais importantes e que continua ainda sendo uma das lentes mais adaptadas no mundo é a lente rígida Soper, criada pelo nosso amigo e mentor Joseph W. Soper na Baylor Medical College em 1968.
Também em 1970 uma técnica chamada piggyback foi introduzida nos EUA com a finalidade de facilitar a adaptação de lentes de contato, consistia na adaptação da lente rígida sobre uma lente gelatinosa e continua sendo até hoje uma técnica utilizada, geralmente com bastante limitação e com um custo x benefício não muito favorável ao paciente, utilizada quando não se consegue obter uma boa adaptação com as lentes RGPs. O problema é que em grande parte dos casos o paciente irá desenvolver uma intolerância a esta técnica, especialmente pelo fato de a lente gelatinosa (mesmo descartável) provoca a médio-longo prazo uma intolerância alérgica devido à menor hidratação da córnea que ocorre com a lente gelatinosa. Outra tecnologia introduzida em meados de 1977 foi a lente híbrida, com um centro rígido e uma “saia” gelatinosa, chamada inicialmente de lente Saturno 1, esta lente apresentou problemas de descolamento da porção gelatinosa que rasgava com facilidade, mais tarde surgiu então a nova versão Saturno II que tinha a finalidade de ser mais resistente. Esta lente continuou a apresentar problemas com a porção gelatinosa periférica além de criar situações de edema de córnea por hipóxia (carência ou ausência de oxigênio suficiente para manter a córnea fisiologicamente saudável). Mais tarde a tecnologia foi reintroduzida no mercado sob o nome de Softperm e posteriormente vendida a outra empresa que novamente introduz no mercado a lente com o nome SynergEyes.
A lente tipo Soper foi aos poucos adotada no mundo inteiro e até hoje ainda é a lente mais adaptada para o ceratocone. Em alguns países surgiram variações desta lente cada uma prometendo um avanço em relação a original. Em 1986 surgia a lente Ultracone tipo Soper Modificada, fabricada pela Ultralentes que vem sendo aprimorada até os dias de hoje. Em 1988 aproximadamente o optometrista Neo-Zelandês Paul Rose criou uma destas variações chamando-a de Rose K patenteando seu desenho e através de um marketing muito bem feito vendeu a tecnologia através de royalties para países da América do Norte e Europa e posteriormente vendeu os direitos a uma empresa americana e esta repassou a outra maior.
No Brasil, em 1986 surgia a Ultralentes, laboratório criado pelo Dr. Saul Bastos (meu pai) e eu com a finalidade de desenvolver soluções para casos de alta complexidade como o ceratocone, pós-transplante de córnea, pós-cirurgia refrativa, pós-trauma, afacia, alta miopia e astigmatismos elevados, além dos casos de miopia e hipermetropia simples. De início começou o projeto Ultracone ou também conhecida na época como lente Soper Modificada que ele já adaptava em seus pacientes e com a Ultralentes passou a ter uma série de aperfeiçoamentos na tecnologia de fabricação e no seu desenho e a tornaram uma das melhores lentes especiais para ceratocone já desenvolvidas.
Diferentemente das demais lentes fabricadas pelas empresas de grande porte e com eficientes sistemas de fabricação, de distribuição e de vendas, a lente Ultracone passa a ser um artigo de luxo de alta tecnologia e primorosa qualidade adaptada por um seleto número de especialistas muitos freqüentes palestrantes sobre o tema adaptação de lentes especiais em congressos de oftalmologia como o próprio Dr. Saul Bastos.  

Por mais de 100 anos as lentes de contato tem sido a primeira opção de modalidade para o tratamento do ceratocone. Poucas modalidades em toda a medicina obtiveram tamanho sucesso em longo prazo. Observa-se também que em diversas vezes tentou-se reintroduzir tecnologias especialmente em lentes gelatinosas ou híbridas que acabaram mostrando as mesmas limitações e complicações do passado.  Muitos pacientes são levados a acreditar que estas modalidades alternativas de lentes são inovações mas na verdade não passam de reintroduções de tecnologias já experimentadas no passado que não tiveram êxito e por isso não sustentaram-se.
As lentes rígidas, hoje conhecidas como gás permeáveis (GPs) são indiscutivelmente as que oferecem a melhor qualidade e acuidade visual e se forem de alta tecnologia, de boa qualidade final e bem adaptadas oferecem grande conforto, a melhor acuidade visual possível de se obter e garantem a saúde fisiológica da córnea, fundamental na adaptação de lentes de contato.
Talvez a melhor inovação em lentes de contato desta década seja a reintrodução das lentes esclerais e semiesclerais rígidas feitas em materiais de alta permeabilidade ao oxigênio. A Ultralentes iniciou um projeto de pesquisa e desenvolvimento destas lentes em 2003 e somente no final de 2007 as primeiras lentes foram fabricadas e iniciou-se os testes clínicos no Instituto de Olhos Dr. Saul Bastos (IOSB). No final de 2008 já havia mais de 50 pacientes adaptados com as lentes SSB e com resultados extremamente animadores, sem nenhuma complicação. Em Julho de 2009 a Ultralentes anuncia então de forma pioneira o lançamento de sua linha de lentes de contato esclerais e semiesclerais com os nomes de Scleral Bastos (SB) e Semi-Scleral Bastos (SSB) com lentes de diâmetros de 16 a 21 mm de diâmetro de desenhos asféricos de alta complexidade geométrica.  O melhor desta tecnologia é que ela permite a utilização destas lentes além de tratamento corretivo da visão, como tratamento terapêutico em algumas doenças da superfície ocular.*
Lente Ultracone Scleral Bastos (SB) em ceratocone avançado,
cortesia Ultralentes.

O custo mais elevado destas lentes justifica o investimento especialmente naqueles casos onde o paciente tentou adaptar diferentes lentes rígidas sem sucesso, casos onde mesmo os mais avançados desenhos de lentes corneanas não foram suficientes para oferecer conforto e boa adaptação.  As lentes SB e SSB possuem dois variações, a Ultracone (SB ou SSB) e a Ultraflat (SB ou SSB). Os especialistas que já estão adaptando aos poucos estas lentes podem optar entre o modelo SSB de diâmetro entre 14.5 mm. e 16.0 mm. ou a SB de diâmetro entre 16.5 mm. e 21.0 mm.
Atualmente o IOSB possui uma casuística de mais de 250 casos de pacientes em sua maioria ceratocone de iniciais á moderados com intolerância a lentes rígidas corneanas, pacientes com ceratocone e deficiências lacrimais, casos de ceratocone pós-implante de anel, casos de Degeneração Marginal Pelúcida, casos de ceratoglobo, casos de ceratocone extremo (acima de 70 dioptrias), casos de pós-transplante de córnea com astigmatismos elevados, cerca de 10 casos pós-trauma e a utilização como tratamento terapêutico em casos de olho seco por ceratoconjuntivite sicca, por síndrome de Sögren, Síndrome de Stevens Johnson e um caso de queimadura química. O índice de complicações destas adaptações é praticamente nulo, em dois casos foram diferentes fenômenos foram observados e resolvidos em tempo hábil, essa é a grande diferença em ser detentor de uma tecnologia e poder aperfeiçoá-la em tempo real, pode-se corrigir o rumo durante o processo sem depender externa.
É sempre importante mencionar fatos, contra fatos não há argumentos. As lentes de contato RGPs e atualmente as lentes esclerais e semiesclerais GPs são largamente a modalidade de tratamento de correção visual mais eficaz que existe para os potradores de ceratocone. Embora alguns casos sejam beneficiados com os novos procedimentos cirúrgicos nenhum deles supera a adaptação de lentes de boa qualidade como a melhor alternativa para o paciente retomar suas atividades profissionais e sociais sem maiores dificuldades.

Avanços em Tratamentos Cirúrgicos para o ceratocone
Transplante de Córnea

Os últimos 25 anos apresentaram avanços significativos nos tratamentos cirúrgicos para o ceratocone. Se olharmos para o ano de 1986 a única opção cirúrgica para o ceratocone era o transplante de córnea tradicional de todo o botão, chamada de ceratoplastia penetrante. Foi durante um tempo um procedimento que requeria a internação do paciente por alguns dias.
Atualmente todas as cirurgias para o ceratocone são realizadas com pacientes que baixam para o procedimento e após um determinado número de horas vão para suas casas para fazer a recuperação. A própria técnica tradicional teve aprimoramentos que passam por instrumentos mais precisos e pela sensibilidade do cirurgião que quando tem uma curva de experiência consegue obter um resultado melhor com uma superfície corneana menos irregular em torno do botão doado.
O uso da tecnologia do femtosecond laser possibilita resultados ainda melhores devido a sua capacidade de gerar um receptáculo na córnea hóspede com um encaixe para o botão da córnea doada que também é trabalhada pelo laser. Este encaixe do tipo “macho-fêmea” possibilita uma superfície bem mais homogênea e menos irregular, com uma cicatrização melhor e mais rápida se comparada á técnica tradicional. A técnica tradicional pode levar entre 12 a 18 meses até a total estabilização enquanto a técnica utilizando o femtosecond laser pode reduzir esse tempo para entre algo entre 6 a 9 meses.

Transplante Lamelar Anterior Profunda (DALK)
O mais recente avanço cirúrgico para o ceratocone em transplante é o refinamento da técnica de transplante de córnea de espessura parcial ou lamelar. Embora a técnica de transplante de espessura parcial (lamelar) esteja sendo praticada há muitos anos a melhor resposta visual está sendo obtida com uma refinada técnica introduzida pioneiramente pelo Dr. Mohammed Anwar na Arábia Saudita. Com a “grande bolha” (Ceratoplastia Lamelar Anterior Profunda), ar é injetado dentro da córnea de maneira que a membrana de descemet (logo abaixo do epitélio corneano) seja separada do estroma e assim o cirurgião poderá retirar a parte afetada pelo ceratocone sem entanto retirar o endotélio corneano (camada mais profunda da córnea).
As células endoteliais têm um papel extremamente importante em retirar excesso de água da córnea e manter sua transparência. Com o transplante tradicional a córnea receptora do paciente poderá reconhecer o botão do enxerto doador como um inimigo e rejeitar atacando-o como um invasor. Isso pode destruir as células endoteliais críticas que não se regeneram. Mesmo com a inexistência de rejeição estas células tendem a morrer algum tempo após o transplante tradicional e eventualmente a córnea pode tornar-se nublada perdendo a transparência e o transplante tem que ser refeito com uma nova córnea.
A técnica do transplante lamelar anterior profundo possibilita ao paciente manter o seu endotélio, permanecendo assim com suas células endoteliais e desta maneira a rejeição praticamente deixa de ser uma preocupação. Um enxerto feito com esta técnica deve ser apto a durar por toda a vida do paciente.

Implante de anéis intraestromais
Os segmentos de anéis intraestromais foram desenvolvidos inicialmente no Instituto Barraquier com o nome de Intacs para controle e redução da miopia. No Brasil, durante a década de 90 o oftalmologista Dr. Paulo Ferrara desenvolveu um protótipo com diferentes nomogramas para o tratamento do ceratocone, chamada técnica do Anel de Ferrara. Tempos depois outros fabricantes criaram suas versões chamadas Corneal Rings e Kerarings com diferentes desenhos. Atualmente há um aprimoramento da técnica que pode ser feita utilizando a tecnologia do femtosecond laser para produzir os dutos nos quais os segmentos do anel serão inseridos. A finalidade é gerar dutos com profundidade e tamanho precisos para a obtenção de melhores resultados. Alguns cirurgiões defendem a técnica manual dizendo que se o cirurgião tem experiência ele pode criar os dutos manualmente com o instrumento original para este fim com resultados similares e com o custo bem menor, não havendo de fato necessidade de utilização do laser para este fim.
Esta técnica visa prover a córnea com um reforço para deter o avanço da patologia e ao mesmo tempo reduzir a distorção causada pelo ceratocone. O implante de anéis intraestromais (também chamados intra-corneanos) pode ocasionalmente melhorar a visão mas em grande parte dos casos uma correção visual é ainda necessária, as vezes os óculos podem ajudar mas geralmente há a necessidade de adaptar lentes de contato.
Trata-se de uma técnica cirúrgica minimamente invasiva quando comparada ao transplante de córnea. Embora os defensores da técnica afirmem que facilita a adaptação de lentes de contato o que se observa é que em grande parte dos casos há a necessidade de adaptação de lentes rígidas gás permeáveis. Essa adaptação em certos casos passa a apresentar complicações originadas por uma elevação provocada pela extremidade de um dos segmentos na porção para-central da córnea o que dificulta a adaptação da lente rígida devido ao toque que é gerado. Este toque nesta região leva a uma ceratite de contato e se não interrompida o uso de lentes, pode gerar uma erosão e em último caso uma úlcera de córnea.
Alguns oftalmologistas optam pelo uso de lentes gelatinosas ou pelo sistema de piggyback descrito no início do artigo, o que leva naturalmente ás complicações ora expostas anteriormente. Na nossa experiência no IOSB tivemos que desenvolver uma lente especial para adaptação pós-implante de anel, chamada de Ultracone PCR (Post-Corneal Ring) e que através de curvas asféricas de maior excentricidade e de maior valor sagital procuram sobrepor esta elevação. Em Novembro de 2011 saiu um artigo na revista Contact Lens Spectrum Magazine escrito por mim que foi inclusive capa da revista no qual eu demonstro exatamente as dificuldades criadas em certos casos pela presença do anel em relação a adaptação de lentes rígidas e como a Ultracone PCR é capaz de em muitos desses casos solucionar o problema.
Capa do periódico científico Contact Lens Spectrum Magazine publicada em Novembro de 2011
com artigo de capa sobre adaptação de lentes de contato em ceratocone pós-implante de anel.


Uma outra ótima alternativa que encontramos foi a adaptação de lentes semiesclerais ou mesmo esclerais nestes casos, especialmente nos casos mais avançados com implante de anel onde mesmo a Ultracone PCR não foi suficiente ou teve resultados limitados. Há um vídeo no You Tube demonstrando a adaptação da lente Ultracone SSB em um caso pós-implante de anel onde não foi possível a adaptação da Ultracone PCR devido ao grau elevado do paciente. O vídeo pode ser visto abaixo.

Ultracone SSB adaptada com sucesso em ceratocone pós-implante de anel, cortesia IOSB.
Crosslinking de Colágeno de Córnea com Riboflavina
A mais recente intervenção cirúrgica minimamente invasiva para o ceratocone é o crosslinking de colágeno de córnea com riboflavina sob luz ultravioleta. Pela primeira vez temos uma técnica que permite de fato interromper a progressão do ceratocone. O procedimento visa aumentar a resistência biomecânica da córnea com a liberação de radicais livres de oxigênio o que normalmente tenta se evitar com o uso de antioxidantes mas nesse caso o procedimento visa enrijecer a córnea adiantando o seu “envelhecimento” e com isso sua dureza. Desta forma segundo os estudos que vem sendo realizados desde 2001 o tratamento é eficaz para deter a progressão do caso. Alguns casos surpreendem os especialistas por observar que mesmo alguns pacientes melhoram a visão e o formato da córnea com uma parcial regressão do ceratocone mas isso não pode e não deve ser considerado na hora de decidir optar pelo procedimento pois não há garantia real de que isso irá ocorrer.

Métodos do Crosslinking (CXL)
Há duas correntes que defendem a aplicação do crosslinking sendo a primeira o método originalmente criado de remoção do epitélio (epithelium off) que é bastante doloroso para o paciente nos primeiros dias mas que pode ser contornado com a utilização de analgésicos e a outra que consiste em manter o epitélio (epithelium on). Há uma discussão sobre a necessidade de remoção do epitélio corneano, pois a não remoção do epitélio garante um maior conforto ao paciente embora a técnica de remoção do epitélio produz um efeito maior uma vez que há maior penetração da riboflavina no estroma. Segundo os especialistas que defendem a remoção do epitélio a riboflavina tem ação efetiva no terço anterior da córnea e com isso a não remoção do epitélio acarreta numa penetração muito pequena da riboflavina comprometendo a eficácia do tratamento.


Segundo os idealizadores do tratamento do crosslinking a remoção do epitélio é fundamental para que seja atingido o objetivo principal que é deter os episódios de progressão e a indicação do tratamento somente é feita se houver a constatação inequívoca de que o ceratocone encontra-se em episódios de progressão recentes. O protocolo de segurança tal qual foi concebido por Theo Seiler e Gregor Wollensak (Protocolo de Dresden) é o único que possui um histórico de casos que podem ser analisado embora o tempo e o pequeno número de procedimentos realizados representem ainda uma amostragem pequena e sem a comprovação de longo prazo. Em todo o caso os resultados observados até então são animadores no sentido de resguardar a segurança dos pacientes.
Interessantemente mesmo na Alemanha onde o crosslinking foi concebido já há muitos oftalmologistas realizando combinações de métodos o que foge do tratamento originalmente proposto no protocolo do CXL.  Há uma tendência de alguns especialistas mais ousados e interessados em expandir a aplicação do CXL em conjunto com outras técnicas como a cirurgia refrativa por fotoablação a laser e implante de anel. Estas variações foram denominadas então de experimentos possivelmente inspirados por um novo protocolo chamado de Protocolo de Atenas.
O Protocolo de Atenas é a combinação de uma cirurgia por PRK topo-guiado com a finalidade de diminuir ao máximo as irregularidades corneanas presentes no ceratocone mas evitando ao máximo a queima excessiva de tecido e a aplicação simultânea, na verdade logo em seguida, do crosslinking (CXL). O propósito é obter uma superfície ocular mais homogênea e prevenir que a mesma possa alterar utilizando o CXL para este fim. A técnica utiliza o laser topo-guiado para remover o epitélio e membrana de Bowman e ao mesmo tempo regularizar a superfície e já abrir o caminho para a aplicação do crosslinking uma vez que a penetração da riboflavina será maior e portanto garante uma maior eficácia do CXL. Foram apresentados resultados clínicos comprovando este fato.

Keraflex um novo tratamento para o ceratocone
Em 2009 surge uma nova técnica para tratamento do ceratocone que consiste em esquentar a porção interna córnea utilizando uma tecnologia de microondas e ao mesmo tempo mantendo a superfície fria para não comprometer as demais estruturas. O calor gerado pelo microondas tem a finalidade de criar um efeito de moldeamento corneano de aplanamento corneano, fazendo com que grande parte da miopia gerada pelo ceratocone seja neutralizada, embora os estudos apresentados reconheçam que o astigmatismo corneano ainda resta após o procedimento. Logo em seguida uma variação do Crosslinking é aplicada sobre a córnea desepitelizada, com o uso de uma riboflavina modificada.
O Crosslinking Acelerado foi parte essencial do estudo e foi desenvolvido posteriormente ao Keraflex pois observou-se que o ideal é que o crosslinking seja aplicado com a córnea ainda em seu estado mais “derretido” para que segurasse nessa posição mais plana, procurando eliminar ou ao menos amenizar a área cônica provocada pelo ceratocone. O crosslinking acelerado como é chamado é realizado entre 5 a 7 minutos e isso foi possível graças a riboflavina modificada desenvolvida.
Embora a técnica seja promissora no sentido de abrir uma nova perspectiva de tratamento é importante mencionar que as mesmas limitações de indicação do crosslinking são observadas no Keraflex e resultados à longo prazo são necessários para garantir a segurança e eficácia do método.

Conclusão
É inegável que houve muitos avanços nestes últimos 100 anos desde que o ceratocone tornou-se conhecido. É igualmente inegável que as décadas recentes apresentaram alternativas cirúrgicas menos invasivas que funcionam para alguns casos sozinhas. Mas ainda há um longo caminho a se percorrer até que resultados mais consistentes sejam obtidos e que tenhamos uma amostragem real e significativa de longo prazo para sabermos de sua eficácia e segurança.
É importante mencionar dois fatores importantes sobre causa e tratamento do ceratocone, primeiro que todos os estudos investigativos das causas do ceratocone apontam em determinado momento o fato de que coçar os olhos está presente na imensa maioria dos casos. Logo, tratar esse sintoma com anti-alérgicos e acredito que hidratar a superfície ocular com lubrificantes com menor conteúdo possível de conservantes ou sem preservativos seja uma boa idéia. O outro fator importante é que mesmo com todos estes novos métodos de tratamento cirúrgicos disponíveis a adaptação de lentes de contato especiais corneanas ou esclerais gas permeáveis continua sendo a melhor forma de reabilitação visual do paciente com ceratocone mesmo após os procedimentos serem realizados, salvo exceções onde a acuidade visual obtida sem correção foi suficiente para devolver uma acuidade visual satisfatória com ou sem óculos. Os avanços obtidos nos novos desenhos de lentes especiais  oferecem ao paciente segurança, conforto e especialmente a manutenção da saúde fisiológica da córnea.
Na medida em que novas informações sejam disponibilizadas sobre o tema ceratocone e tratamentos elas serão postadas neste espaço.
Um Feliz 2012 a todos com saúde e melhor qualidade de visão.


Em colaboração com o Blog C&T.